Sylvia Colombo https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br Latinidades Tue, 30 Nov 2021 12:31:53 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Dez anos sem o olhar astuto e devorador de Rodolfo Fogwill https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2020/08/28/dez-anos-sem-o-olhar-astuto-e-devorador-de-rodolfo-fogwill/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2020/08/28/dez-anos-sem-o-olhar-astuto-e-devorador-de-rodolfo-fogwill/#respond Sat, 29 Aug 2020 00:05:59 +0000 https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/files/2020/08/images.jpg https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=3635 Poucos eventos, típicos desta época pandêmica, e virtuais, lembraram os 10 anos da partida do escritor argentino Rodolfo Fogwill (1941-2010), morto devido a complicações respiratórias vinculadas a seu resistente vício aos cigarros. A lembrança, porém, foi intensa, em termos de homenagens postadas nas redes, artigos de críticos e de colegas escritores nos meios de comunicação argentinos.

A editora Alfaguara, em sua filial local, que lançou a maioria de seus livros, realizou uma semana de leituras, palestras e sessões de exibição, tudo online, tendo a obra de Fogwill como tema. Dela participaram escritores como Martín Kohan, Leila Guerriero, Pola Oloixarac, Alan Pauls, Patricio Pron e Patricio Zunini, entre outros.

Além disso, a Biblioteca Nacional também divulgou vários vídeos em que Fogwill aparece lendo seus próprios textos, algo que emociona, passados tantos anos.

Há uma novidade, porém. Em março do ano que vem, a Alfaguara argentina lançará uma edição especial de seus três primeiros livros de contos: “Mis Muertos Punk” (1980), “Pájaros En La Cabeza” (1985) e “Música Japonesa” (1982).

Os volumes se somam aos livros póstumos também lançados pela Alfaguara, “La Gran Ventana de Los Sueños” (2013), sobre o qual escrevi, na época, para a Ilustrada, e “La Introducción” (2016), seu último romance.

Rodolfo Fogwill faz parte da geração que renovou a literatura argentina pós-Borges e Cortázar. Ao lado de Cesar Aira, Ricardo Piglia (1941-2017) e Juan José Saer (1937-2005), marcou uma nova fase nas letras argentinas. Foram autores que discutiram o realismo e lançaram um olhar crítico à própria classe média argentina.

O principal exemplo disso é o livro mais conhecido de Fogwill, “Os Pichiciegos”, sobre os garotos que resolvem escapar do Exército durante a Guerra das Malvinas. O romance foi escrito em seis dias e pouco depois do conflito, que terminou com uma terrível derrota da Argentina.

Fumante inveterado, foi vítima de vários efeitos do cigarro, desde uma deformação no rosto até o enfisema que terminou matando-o de forma relativamente precoce.

Em 2007, na Bienal do Livro do Rio, entrevistei Fogwill, em meio a uma cortina de fumaça, pois ele apagava um cigarro acendendo outro. Mesmo com o cigarro aceso na ponta dos dedos, dizia que andava obcecado em melhorar seu modo de vida, estava indo a uma academia e nadando. Seu corpo magro, alto e enrugado transmitia uma estranheza excêntrica que tinha como emblema máximo seu olho mais aberto que o outro, atento ao interlocutor, e sua fina ironia. 

Em homenagem aos dez anos de sua morte, republico aqui os principais trechos da entrevista realizada por mim, com Fogwill, em 2007, no Rio de Janeiro.


Folha –
“Os Pichiciegos” foi escrito no calor dos acontecimentos, em 1982. Ou seja, não havia ainda relatos pessoais sobre o que estava sucedendo (na Guerra das Malvinas). Em que baseou seus personagens?

Rodolfo Enrique Fogwill – Quando escrevi essa história, não havia informações sobre o cenário de conflito. Tudo é invenção. Acertada, mas invenção. Diria que foi uma invenção dedutiva. A visão dessa guerra falsa e subterrânea era produto do meu conhecimento sobre as guerras, sobre aquela geração de rapazes, sobre o comportamento dos impérios e sobre o clima inóspito do sul argentino.

Folha – Por que o sr. preferiu o ponto de vista dos que desertaram, e não o dos que seguiram lutando?

Fogwill – Naquela época, assim como hoje, eu odiava as Forças Armadas argentinas, o Exército britânico e o imperialismo. Se me tivessem recrutado compulsivamente, como aconteceu com os rapazes do livro, eu teria optado pela deserção. A propaganda oficial dos dois lados recrutava consciências. Isso era um desafio para um escritor de ensaio ou de narrativa. 

Requeria operações de ficção e trabalhos com a narrativa. Não podia fazer outra coisa senão esse tipo de relato. Meus desertores imaginários eram o melhor objeto de investigação para minha ideia, a de que um desertor é quem constrói uma economia de guerra pelas costas dos outros. Parecia-me mais verdadeiro falar deles do que investigar o destino dos infelizes que se condenaram a protagonizar o conflito. Penso que o verdadeiro, no ser humano, só aparece no exercício da liberdade dentro de situações-limite.

Folha – Por que a divisão da obra em duas partes, a primeira, composta apenas pelos diálogos dos garotos, e a segunda, mais ensaística?

Fogwill – A primeira parte é o que eu achava que estava acontecendo no cenário do conflito. A segunda corresponde ao que imaginei que sucederia depois. Era uma aposta alta e o rumo dos acontecimentos posteriores mostrou que eu tinha razão.

Folha – Estamos no aniversário de 25 anos do conflito das Malvinas. Que lugar acha que o episódio teve dentro do processo de redemocratização da Argentina?

Fogwill – A aventura das Malvinas se produziu quando a ditadura já havia derrotado a guerrilha e sua frente interna estava minada pelos que preparavam a transição democrática com o apoio do consenso internacional. Sem as Malvinas, a transição teria sido mais lenta, mas teria se cumprido da mesma forma.

Folha – O debate sobre os suicídios de ex-combatentes, cujo número continua aumentando [estima-se que mais de 260 oficiais tenham se matado desde então], está muito presente na sociedade argentina. Você também pensou nessa conseqüência enquanto escrevia o livro?

Fogwill – Enquanto a tropa resistia sem contato com o país e com o mundo, eu imaginei duas manifestações trágicas posteriores. O fato de que os ex-soldados seriam tratados cada vez mais como doentes mentais e o esquecimento, que resultou nas pensões vergonhosas que recebem até hoje. A sociedade argentina usou todos os meios para neutralizá-los. Esperava pelos suicídios, mas não numa taxa tão alta.

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Molano, morre o maior conhecedor das guerrilhas da Colômbia https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2019/10/31/molano-morre-o-maior-conhecedor-das-guerrilhas-da-colombia/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2019/10/31/molano-morre-o-maior-conhecedor-das-guerrilhas-da-colombia/#respond Thu, 31 Oct 2019 18:00:51 +0000 https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/files/2019/10/5a15a2ac1bcb5-320x213.jpg https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=3438  Alfredo Molano Bravo, morto nesta quinta-feira (31), aos 75, em consequência de um câncer de garganta, foi o maior conhecedor da formação das guerrilhas colombianas. E aprendeu sobre elas caminhando por seu país. Um verdadeiro repórter-historiador, que trilhou caminhos perigosos, desertos e selvas em busca das coisas que queria relatar. E que hoje são seu legado, em seus mais de 20 livros, como “Los Años del Tropel: Relatos de La Violencia” (1985), “Trochas y Fusiles” (1994), “Ahí le Dejo Esos Fierros” (2009) e “De Río en Río” (2017), sua obra mais recente.

Seu objeto de estudo era o campo colombiano da segunda metade do século 20, um cenário de violência e de embates iniciados tempos atrás. Mas, ao mesmo tempo em que buscava as origens do problema: distribuição desigual de terras, falta de educação formal da população, apontava soluções e alternativas. Suas investigações incluíam a compreensão das culturas locais e seus símbolos, da relação entre eles, do impacto das políticas de distintos governos e de destrinchar as razões da violência e do desenvolvimento de uma cultura da violência.

Seus escritos sobre a principal guerrilha do país, as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) são referência não apenas para historiadores, mas também para aqueles que trabalharam na negociação do acordo de paz, aprovado em 2016, e que hoje tentam implementá-lo. Suas obras sobre a guerrilha foram feitas em campo, entrevistando combatentes e descrevendo com maestria a paisagem geográfica em que o grupo se formou. Apesar de tratar de tema tão doloroso, suas páginas têm poesia e trazem uma esperança.

Nascido em Bogotá, foi amigo do padre e guerrilheiro Camilo Torres (1929-1966), membro do ELN (Exército de Libertação Nacional) e militante da Teologia da Libertação, a quem conheceu nos anos 60, na Universidade Nacional. Seus escritos logo o trouxeram problemas, sendo obrigado a exilar-se por ser perseguido pelos paramilitares. Durante cinco anos viveu entre a Espanha e os EUA, mas não deixou de escrever. Desde 2003, tinha voltado à Colômbia e recebeu vários prêmios por sua obra, como o Simón Bolívar. Escreveu por muitos anos colunas para o jornal “El Espectador”.

Nos últimos tempos, trabalhava na Comissão da Verdade, estabelecida pelo governo, para esclarecer as mortes e reparar as vítimas de mais de cinco décadas de guerra.

 

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Morre o escritor Leopoldo Brizuela https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2019/05/14/morre-o-escritor-leopoldo-brizuela/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2019/05/14/morre-o-escritor-leopoldo-brizuela/#respond Tue, 14 May 2019 14:30:41 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=3334
Leopoldo Brizuela, morto nesta terça-feira (Foto Divulgação)

O escritor Leopoldo Brizuela, 55, morreu nesta terça-feira (14), em Buenos Aires, causando surpresa e tristeza no meio literário argentino. A causa ainda não havia sido revelada até o fechamento deste texto. Brizuela havia ganho o prêmio Alfaguara de 2012 por “Uma Mesma Noite”, lançado no Brasil pela Alfaguara.

Considerado um dos principais autores de sua geração, Brizuela vivia em La Plata, e perdeu sua biblioteca em 2013, quando houve uma grande inundação na cidade.

Antes, havia estudado em Cambridge e cursado direito e letras na Universidade Nacional de La Plata, uma das mais importantes do país.

Seu primeiro romance, “Tejiendo Agua”, saiu em 1985, e ganhou o prêmio da Fundação Amalia Lacroze de Fortabat. Também era conhecido por seu trabalho como tradutor, tendo vertido ao espanhol obras de Henry James e Flannery O’Connor, entre outros.

Outro de seus livros que tiveram projeção internacional foi “Inglaterra – Una Fábula” (1999), vencedor do prêmio Clarín de Romance.

Em 2012, entrevistei Brizuela por conta do prêmio que havia ganho, em Buenos Aires. “Uma Mesma Noite” é uma reflexão sobre a ditadura na Argentina.

Brizuela aborda o tema por meio de uma ótica pessoal, pois é ambientado em La Plata, baseado em histórias que ouviu de pessoas conhecidas. O livro se passa em dois momentos, durante a ditadura e em 2010, quando, ao testemunhar um assalto, o protagonista, que é um escritor, como Brizuela, lembra-se da noite em que era um garoto e tocava piano enquanto seus pais eram interpelados por um “grupo de tarefas”, os repressores do regime militar, na sala de jantar da mesma casa.

“O que salva o personagem é a literatura, não porque por meio dela encontre respostas, mas porque o mantém confuso e com capacidade de seguir questionando”, contou Brizuela na época.

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Crise argentina impacta com força mercado literário https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2018/10/02/crise-argentina-impacta-com-forca-mercado-literario/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2018/10/02/crise-argentina-impacta-com-forca-mercado-literario/#respond Tue, 02 Oct 2018 03:04:17 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=3213
A livraria El Ateneo, um dos hits turísticos de Buenos Aires (Foto Divulgação)

Buenos Aires é conhecida como uma das capitais latino-americanas do livro e, a Argentina, um dos países com maior índice de leitura proporcionalmente à sua população no continente. Com 3 milhões de habitantes em sua capital (sem contar a Grande Buenos Aires), possui 750 livrarias, o que dá mais ou menos 25 para cada 100 mil habitantes. Quanto a títulos publicados, nos últimos anos, o país vinha editando quase a metade do Brasil, mas aí conta a proporção. A Argentina tem 42 milhões de habitantes, o Brasil, 207 milhões. Ou seja, o índice de leitura sempre foi maior do lado de cá do Río da Prata.

A crise econômica que o país enfrenta, porém, vem mudando este mapa e causando certo desespero nas editoras locais. A inflação, mais o aumento do dólar _o papel usado nos livros não é importado, mas sim indexado segundo o dólar_ está levando os preços de livros às alturas. Nos últimos meses, o preço do papel para livros subiu 75%, enquanto o do papel-cartão para as capas, 165%.

“Nós fazemos o possível para não transferir esse custo ao consumidor, mas chega um momento em que é impossível”, diz Leonora Djament, da renomada editora e livraria Eterna Cadencia.

As editoras consideradas de autor e as independentes vêm encontrando uma saída em editar junto e usar espaços comuns para vendas de livros de muito baixas tiragens. É o caso das 24 editoras que formam La Coop, uma espécie de cooperativa que tenta usar gráficas comuns, fazer eventos em que cada um aporta um pouco, propagandear umas às outras, fazer livros sob encomenda ou sob medida, e, assim, ir apostando em livros que, de repente, podem virar um êxito e acabar bancando outros.

Mas as maiores sofreram ainda um novo baque. O governo deixou, praticamente, de comprar livros. A porcentagem de compras do Estado foi de 14% do que produziam as editoras, em 2016, para 1% em 2017, e para praticamente zero neste ano. “É o primeiro ano em que o Estado não compra quase nada. Nunca foi o essencial para nossa produção, mas garantia uma entrada segura, com a qual contávamos”, diz Carlos Díaz, da Siglo 21. E acrescenta: “Nós víamos essa situação vir piorando nos últimos anos, mas nos últimos três meses (que corresponde à disparada da inflação e o aumento do dólar), essa queda se pronunciou muito.”

Djament acrescenta que a situação é alarmante por se tratar de uma área essencial para a sociedade. “Pensar que não se repõem livros em bibliotecas públicas, de universidades, é de temer por nosso futuro”. Díaz explica que os livros didáticos ainda vendem bem, mas estes são na maioria importados ou editados aqui, mas por matrizes espanholas. Ou seja, não alimenta o mercado local.

Para Diaz, isso não significa que o argentino se desinteressou da leitura completamente. “Você vai aos eventos, às feiras, às palestras, e elas estão cheias. Eu creio que há demanda. Mas, quando a pessoa precisa escolher entre pagar as tarifas de gás e eletricidade (que perderam subsídios), comprar comida ou comprar livros, obviamente ela vai deixar o livro para comprar depois, quando, e se, a situação melhorar.”

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Livros para entender o terremoto no México de 1985 https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2017/09/20/livros-para-entender-o-terremoto-no-mexico-de-1985/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2017/09/20/livros-para-entender-o-terremoto-no-mexico-de-1985/#respond Wed, 20 Sep 2017 13:21:05 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=2976 Depois de 19 de setembro de 1985, vários livros de ficção e não-ficção fizeram o esforço de refletir sobre a tragédia que ocorreu naquele dia, quando um terremoto de 8 pontos deixou entre 5 mil e 30 mil mortos (nunca houve uma estimativa mais acurada) e mais de 800 edifícios da capital mexicana vieram ao chão. O país estava a meses de receber uma Copa do Mundo, e a cidade, despreparada para uma tragédia assim. Desde então, como contam vários especialistas, desenvolveu-se no país uma “cultura de terremoto”, em que os habitantes eram instruídos com frequência sobre como responder a um evento dessa magnitude e os prédios passaram a ser construídos com outra estrutura, mais resistente. Talvez essa seja uma das razões pelas quais a cifra de mortos, pelo menos por enquanto, não esteja perto da cifra da tragédia de três décadas atrás.

Terremoto de 1985, pessoas fogem enquanto edifícios desabam (Foto El Universal)

Seguem as recomendações de leitura.

“Nada, Nadie: Las Voces del Temblor”, Elena Poniatowska (ed. Era, importado)

Como já havia feito antes em seu memorável livro “La Noche de Tlatelolco”, a escritora e jornalista franco-mexicana sai a recolher relatos. Na obra, sobressaem não só as dramáticas histórias humanas, mas o registro em tempo real da reação da sociedade, que saiu às ruas a solidarizar-se e a ajudar nas tarefas de resgate.

“No Sin Nosotros – Los Días del Terremoto”, Carlos Monsiváis (ed. Era, importado)

O livro é uma mescla de ensaio e de experiência pessoal, dividido em duas partes. Numa delas, Monsiváis (1938-2010), um dos mais importantes escritores mexicanos desde o Nobel Octavio Paz, conta a partir de seu ponto de vista como foram o dia do terremoto e os que se seguiram. Noutra, reflete sobre a sociedade civil mexicana e outros momentos nos quais foi chamada a mobilizar-se, e em como esta se transformou nos anos seguintes à tragédia.

 

“Zona de Desastre”, Cristina Pacheco (ed. Oceano, importado)

A jornalista Cristina Pacheco, na linha de Poniatowska, também baseia seu livro em relatos, mas com um propósito claro, o de mostrar que o terremoto expôs um problema social que “todos sabiam que existia, mas que ninguém queria ver”, ou seja, que grande parte da população da megalópole vivia em condições precárias de habitação, saneamento e sem acesso à orientação sobre como atuar em situações como essa. Pacheco foi casada com o poeta José Emilio Pacheco (1939-2014).

“Arte y Olvido del Terremoto”, Ignacio Padilla (ed. Almadía, importado)

Morto de modo prematuro no ano passado, Ignacio Padilla (1968 – 2016), um dos principais nomes da nova literatura mexicana, reflete sobre o silêncio dos intelectuais com relação à tragédia. Neste ensaio, tenta entender porque não surgiu a partir do terremoto de 1985 uma “arte dos terremotos” e se tão pouco sobre a influência da tragédia na mudança psicológica da sociedade. Conclui considerando que intelectuais tinham uma dívida pendente com a memória coletiva do país ao não tratar do fato o suficiente e a suas diferentes sequelas

“Ciudad Quebrada “,  Humberto Musacchio (ed. Brigada para Leer en Libertad, importado)

O jornalista faz uma crônica dos dias do sismo, contextualizando o momento em que o país vivia do ponto de vista político. Como se sabe, o então presidente, que era do PRI, Miguel de La Madrid, foi muito questionado em sua atuação branda, sua demora em reagir e sua tentativa de maquiar os números oficiais para baixo. Para Musacchio, a catástrofe serviu para despertar um novo tipo de consciência política no país.

 

 

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Feira de Guadalajara premia Norman Manea https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2016/09/28/feira-de-guadalajara-premia-norman-manea/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2016/09/28/feira-de-guadalajara-premia-norman-manea/#comments Wed, 28 Sep 2016 19:06:04 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=2545 O escritor romeno Norman Manea, premiado no México (Foto El País)
O escritor romeno Norman Manea, premiado no México (Foto El País)

Em vez de ter apenas um país homenageado, como todos os anos, a Feria Internacional del Libro de Guadalajara, maior evento do mercado editorial de língua hispânica, que ocorre de 26 de novembro a 4 de dezembro neste ano, homenageará a literatura de toda a América Latina, o que significa uma representação reforçada de todos os países.

O vencedor do prêmio máximo do evento, porém, virá de outra paisagem. O júri decidiu premiar o romeno Norman Manea, 80, pouco traduzido no Brasil, e que trata especialmente do tema do exílio e das “identidades itinerantes” em sua literatura.

Leia, abaixo, a entrevista que Manea deu ao blog, por e-mail, falando de sua relação com a literatura latino-americana e sua participação no evento.

Folha – Há apenas um de seus livros traduzidos ao português no Brasil, “O Retorno do Hooligan”.  Na verdade, ainda existe um grande abismo entre nosso país e a do Leste Europeu. Que razões o sr. dá para isso? O sr. crê que esse cenário pode mudar com o enfraquecimento da mediação por meio de editoras dos centros europeus ocidentais e dos EUA?

Norman Manea – Eu lamento muito essa situação. A conexão entre a vida cultural fascinante do Brasil e seu movimento literário tão rico é de grande importância e estímulo para qualquer outro ambiente cultural e deveria viajar mais. Há alguns anos, estive como convidado de um evento da PEN, no Rio, e fiquei abismado pela energia, beleza e originalidade do país.

Folha – A questão do exílio é muito importante em seu trabalho e em sua própria biografia. O sr. acha que é uma ironia trágica que aquilo que parecia ser um passado traumático da humanidade seja de novo um assunto tão atual e venha se renovando com a crise dos refugiados na Europa? Como o legado da literatura do exílio pode ajudar a refletir sobre o exílio contemporâneo?

Manea – Sim, é uma ironia trágica, mas infelizmente a literatura não pode ter um impacto social de fato importante nesses dramas globais, pelo menos não em uma grande dimensão. Pode, sim, ter influência em alguns indivíduos. E se isso não se mostra ignorado, já é um bom sinal.

Folha – Li numa entrevista que o sr. costuma ser identificado como um escritor centro-europeu, o que o aproximaria dos universos de Robert Musil ou Franz Kafka, mas que, no fundo, a literatura que o sr. faz estaria mais relacionada a escritores como Marcel Proust. O sr. vê realmente uma distinção muito clara entre essas tradições em seu trabalho?

Manea – Proust é uma grande influência sem dúvida, mas Musil também, é possível ter ambos como mestres e tutores e eu os considero assim. Creio que minha biografia e meu destino me aproximam mais a Kafka, como o símbolo radical do estrangeiro solitário de qualquer tempo e lugar, exilado para sempre em seu próprio quarto ou em suas próprias páginas.

Folha – Essa influência de Proust está bem presente em “O Retorno do Hooligan”, no sentido de que se trata de uma obra de forte conotação memorialística, e que ao mesmo tempo mostra uma Europa em transformação. Está de acordo?

Manea – Prefiro que os leitores e os críticos decidam se esse livro possa ser classificado como “proustiano”, por conta do aspecto socio-político e pela sensibilidade do autor com relação a ela. Prefiro ver como uma espécie de colagem autobiográfica e literária, significativa de nosso tempo e muito dinâmica e turbulenta, com suas raízes na nova modernidade, ou na pós-modernidade, e seus conflitos.

Folha – O sr. leu autores latino-americanos, e brasileiros em particular?

Manea – Na Romênia tivemos muita literatura latino-americana traduzida especialmente nos anos 1960, e gostei muito de autores como os argentinos Martinez Estrada, Jorge Luis Borges e Ernesto Sabato, além de Vargas Llosa. Mas não à literatura brasileira, de que eu me lembre, apenas Jorge Amado era mais amplamente lido. Recentemente, li Clarice Lispector, que por acaso foi parar no Brasil vinda de nossa região.

Folha – O que o sr. espera encontrar no México, durante a FIL?

Manea – Eu estive duas vezes no México, uma em 1990, e recentemente, para o centenário de Octavio Paz. Nos dois casos fui tratado extraordinariamente e achei o nível do debate excelente, além da atmosfera muito amigável. Fiquei chocado, preciso dizer, pela atenção e o apoio que a cultura ainda recebem, mesmo nesses tempos turbulentos, naquele maravilhoso país.

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