Sylvia Colombo https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br Latinidades Tue, 30 Nov 2021 12:31:53 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Drama revive pesadelo da violência na Colômbia https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2021/10/09/drama-revive-pesadelo-da-violencia-na-colombia/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2021/10/09/drama-revive-pesadelo-da-violencia-na-colombia/#respond Sat, 09 Oct 2021 13:51:59 +0000 https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/files/2021/10/el-olvido-que-seremos-fotogramas-1613391055-320x213.jpg https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=3929 Um dos melhores livros da produção latino-americana contemporânea, “A Ausência Que Seremos” (ed. Companhia das Letras, 2005) chega às telas sem ficar devendo muito à obra original –as memórias de Hector Abad Faciolince sobre sua infância e juventude na violenta Medellín dos anos 1970/1980. A adaptação, dirigida pelo veterano do cinema espanhol Fernando Trueba (“Belle Époque”), venceu o Goya de 2021 e está disponível na Netflix.

A obra narra a história de uma família católica e de classe média colombiana a partir do olhar de um garoto fascinado pelo pai, que destoa por sua visão progressista do mundo e por ser ateu. Héctor Abad Gómez (Javier Cámara) foi um ativo médico sanitarista e professor universitário dedicado a melhorar as condições de vida da população dos bairros pobres de Medellín, em meio à escalada do crime organizado. Nos anos 1970 e 1980, a Colômbia vivia uma de suas fases mais violentas, devido à disputa territorial entre os cartéis de Cali e Medellín. Em meio a isso, surgiam agrupações paramilitares, financiadas por grupos de interesses econômicos e políticos.

Neste cenário, foram assassinadas centenas de defensores dos direitos humanos, professores universitários e  sindicalistas. Embora tenha passado sua vida lecionando, sem preferências partidárias, Abad Gómez acabou se envolvendo em política para tentar implementar programas de saúde pública. Em 1987, enquanto fazia campanha eleitoral, foi assassinado violentamente, como se fazia na época: por um sicário, no meio da rua.

O drama nos apresenta, ainda, a outros conflitos desse período da história colombiana, como as disputas entre liberais e conservadores, a convivência com a comunidade judaica e a acelerada modernização de Medellín na época, colocando em xeque valores tradicionais de uma sociedade extremamente religiosa.

Narrada em dois planos, um colorido, o da infância, marcado por boas memórias e também por uma tragédia, e outro em preto-e-branco, quando Abad Faciolince já é adulto e luta para entender tanto as batalhas travadas por seu pai como o drama histórico da Colômbia, a obra é também um retrato do excelente momento da produção cinematográfica colombiana, com ótimas atuações dos atores locais, especialmente de Patricia Tamayo (que faz a mulher de Abad Gómez) e Juan Pablo Urrego, no papel do autor. Cámara, que é espanhol, se esforça para imitar o sotaque colombiano da região da Antioquia.

Abad Faciolince teve uma relação complicada com seu passado, algo que sempre conta em suas entrevistas. Depois da morte do pai, passou muito tempo na Itália, sem imaginar ser possível voltar à Colômbia, pelo trauma familiar e pela decepção geral com seu país. Com o passar do tempo e com os livros que lançou depois, foi se reconciliando com tudo isso.

Hoje, vive em Medellín e diz pensar em envelhecer e morrer aí.

 

 

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As várias vidas de Isabel Allende https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2021/07/03/as-varias-vidas-de-isabel-allende/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2021/07/03/as-varias-vidas-de-isabel-allende/#respond Sat, 03 Jul 2021 20:50:07 +0000 https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/files/2021/07/5bee9feabe9f0_1004x566-320x213.jpg https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=3823 Ser uma escritora e jornalista feminista no Chile dos anos 1970 e ter o mesmo sobrenome do presidente que foi derrubado por um golpe militar não era exatamente uma posição confortável. Longe disso. Os desafios, as tragédias e as conquistas da vida de Isabel Allende, 78, até hoje a autora latino-americana que mais vendeu livros no mundo (74 milhões de exemplares de seus 24 romances) são o tema da mini-série de 3 episódios “Isabel”, que está no Amazon Prime.

Embora siga a vida de Isabel Allende –que é filha de um primo-irmão de Salvador Allende– de modo cronológico, a obra faz vários flashbacks, inspirada na ideia de voltar ao passado e seus fantasmas por meio de espelhos, na toada de seu livro mais famoso, “A Casa dos Espíritos”, de 1982, que começou a escrever quando seu avô estava morrendo.

A série, de elenco e produção chilenas, faz uma fantástica e colorida reconstituição de época, mostrando o Chile dos anos 1970, suas roupas, carros e cortes de cabelo. Ao mesmo tempo expõe o embate entre os costumes de uma sociedade de tradição católica que vinha sendo desafiada pelo espírito setentista, o rock, o feminismo e o espírito revolucionário.

Allende (interpretada por Daniela Ramírez) aparece num primeiro momento como uma dona de casa que, quase casualmente, é chamada para redigir artigos sobre mulheres na revista “Paula” –que, anos depois, marcaria uma época. Só que os temas que vai escolhendo começam a mexer com a sociedade, como a infidelidade feminina e a crítica aos costumes masculinos. Atormentada pelo fato de seu pai ter abandonado a família quando ela era pequena –Tomás Allende era diplomata e a escritora nasceu quando ele estava em funções no Peru–, a autora questionava o formato das famílias tradicionais e o papel da mulher.

Todo a euforia da época da revista, porém, vira um trágico drama quando amanhece o dia 11 de setembro ano de 1973. Depois do bombardeio do La Moneda e o fim do governo Allende, Isabel, que não estava envolvida nas questões políticas do país, começa a ajudar pessoas perseguidas, até que ela mesma entra na lista da repressão. Com os dois filhos e o marido, foge para Caracas, onde sua vida pessoal dá uma guinada. Isabel se apaixona por um músico argentino e escapa com ele para a Espanha, para depois quebrar a cara e voltar arrependida.

A maior dor de sua vida, a morte de sua filha, Paula Frías Allende, aos 28 anos, permeia toda a série, refletindo no modo como a autora lidou, em sua obra, com os dramas familiares, a perda e a culpa. A própria autora confessou, em uma entrevista, que não pôde ver essa passagem da série, pela dor que ainda lhe causa. Paula também inspiraria Isabel a voltar a escrever depois do luto, e o resultado foi o livro “Cartas a Paula”.

Hoje radicada nos EUA, Isabel Allende lançou há pouco tempo “Largo Pétalo de Mar”, inspirado na viagem de mais de 2 mil espanhóis que foram ao Chile fugindo da Espanha franquista, num navio fretado pelo poeta e Nobel Pablo Neruda.

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30 anos sem Manuel Puig https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2020/07/23/30-anos-sem-manuel-puig/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2020/07/23/30-anos-sem-manuel-puig/#respond Thu, 23 Jul 2020 11:49:46 +0000 https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/files/2020/07/puig_xoptimizadax-kpbH-620x349@abc-320x213.jpg https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=3615 Na entrada da cidade de General Villegas, no interior da província de Buenos Aires, há um imenso cartaz que diz: “Terra do escritor Manuel Puig”, ao lado de um retrato do autor de “Boquitas Pintadas” e “O Beijo da Mulher Aranha”. O sinal de reconhecimento, porém, soa irônico para quem conhece sua biografia. Puig, após ser criticado por moradores da cidade que se sentiram mal representados ou distorcidos em suas obras, nunca mais voltou ao local. O mesmo fez com a própria Argentina, país em que nasceu, mas que abandonou quando, nos anos 1970, foi perseguido pela Triple A (esquadrão da morte que obedecia ao governo de Isabelita Perón).

Nesta semana, quando se completam 30 anos de sua morte, a realidade já é outra. General Villegas esteve em festa (ainda que virtual), com lembranças e eventos relativos à data, como ocorre a cada ano. Conhecido por seu vanguardismo e pelo cruzamento de gêneros que realizava em sua obra, assim como pela inovação da estrutura narrativa da literatura argentina, Manuel Puig (1932-1990) teve um reconhecimento tardio na Argentina.

Escritor nômade, com sua Olivetti portátil, Puig viveu em Roma, em Nova York, em Londres, no Rio de Janeiro, em Estocolmo e em Cuernavaca, no México, onde morreu aos 57 anos. Em suas obras, inspirou-se em personagens do submundo, em conversas que escutava entre desconhecidos e até mesmo em histórias contadas a ele por pedreiros e trabalhadores do Rio de Janeiro.

Não se pode dizer hoje que Puig é um autor minimizado. Na atualidade, encontra-se no cânone da literatura argentina. Mas não foi assim enquanto o escritor era vivo. Sentia-se deslocado, não se identificava com bandeiras políticas nem com gêneros literários. Chegou mesmo a ser ridicularizado num concurso editorial espanhol pelo Nobel peruano Vargas Llosa. Foi diminuído ao ser considerado um escritor “folhetinesco”, algo que ele não considerava que fosse negativo. Em constante conflito com a sua identidade, com o tratamento que recebia em seu país e com a hostilidade que sentia por conta de sua homossexualidade, Puig transformou seu sofrimento em literatura, espaço onde se mostrou livre do medo e dos possíveis julgamentos.

Puig odiava alguns elementos essenciais da cultura argentina, e especialmente da vida em Buenos Aires, cidade grande para onde se mudou, ainda adolescente, para estudar. Acreditava que a psicanálise, tão popular ali, era a responsável por “haver matado o romance do século 19” e, que, em seu país, era um vício da classe média. Também era extremamente anti-peronista, chegando a desfazer laços de amizade e afastar-se de pessoas que se mostravam apoiadoras dessa corrente política.

O exterior foi sempre sua casa, embora em suas obras a Argentina e suas contradições tenham estado sempre presentes. Sua primeira paixão foi o cinema, que começou a frequentar com a mãe ainda menino. A única sala de exibição de General Villegas era a do Cine Teatro Espanhol, e Puig esperava com paciência a lentidão das trocas na programação para ver as novidades. Aos poucos, por onde viveu, foi acumulando uma videoteca de fitas de VHS e livros sobre o tema. Porém, se deu conta, ao tentar escrever seus primeiros roteiros, que seu ambiente de criação, de fato, era a literatura.

Puig ia vivendo de um lugar a outro com trabalhos temporários. Chegou a ser garçom na Europa, professor de inglês e espanhol, e funcionário do aeroporto JKF, em Nova York. Foi se acostumando às mudanças contínuas, mas mantinha com amizades literárias e com a mãe, na Argentina, uma intensa correspondência. Parte dela está reunida nos dois volumes de “Querida Família”, pela editora Entropia, da Argentina. Ali há observações da vida nesses países, e mostra que no Rio de Janeiro foi feliz, embora com muitos altos e baixos.

Um de seus grandes sucessos foi “La Traición de Rita Hayworth”, onde surge uma adaptação de sua cidade-natal, rebatiza com o nome fictício de Coronel Vallejos. Trata-se de sua obra com mais experimentações, e com elementos do cinema no formato, como a ideia de montagem. Os elementos do folhetim e da linguagem televisiva são usados de modo aberto e inovador. Algo que não foi bem visto por vários críticos. Na Europa, foi publicado com elogios pela Gallimard (França).

Na Argentina, uma de suas obras mais conhecidas é “Boquitas Pintadas”, também escrita em formato folhetinesco, e que descreve a relação de um homem com três mulheres. A obra que causou sua despedida da Argentina, porém, foi The Buenos Aires Affair, que foi proibida pelo governo. Puig também recebeu, então, as ameaças da Triple A, e decidiu deixar de uma vez o país.

Foi no exílio no México que terminou “O Beijo da Mulher Aranha”, contando a história de dois prisioneiros que dividem uma cela na Argentina, durante o último governo do general Juan Domingo Perón, nos anos 1970. Um deles era um guerrilheiro de esquerda e, o outro, um homossexual envolvido em delitos com menores de idade. No Brasil desde 1980, acabou tendo o romance adaptado para o cinema por Hector Babenco (1946-2016). No elenco, estavam William Hurt, Raul Julia e Sonia Braga.

No Brasil, escreveu ainda mais dois romances, “Sangre de Amor Correspondido”, e Cae La Noche Tropical”, ambos inspirados em personagens e histórias que viu e ouviu no Brasil.

Era um militante dos direitos dos homossexuais e, em seus escritos, deixou claro que o projeto revolucionário das guerrilhas e dos movimentos de esquerda na Argentina não tinham sua simpatia porque não incluíam essa preocupação em sua agenda. Sentia-se incompreendido e não representado nem pela direita nem pela esquerda em seu país. Hoje, curiosamente, livros como “Boquitas Pintadas” integram o currículo de leituras obrigatórias nas escolas.

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No fundo do mar, 200 toneladas de ouro e um ícone literário https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2019/10/19/no-fundo-do-mar-200-toneladas-de-ouro-e-um-icone-literario/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2019/10/19/no-fundo-do-mar-200-toneladas-de-ouro-e-um-icone-literario/#respond Sun, 20 Oct 2019 00:16:03 +0000 https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/files/2019/10/1200px-Wagers_Action_off_Cartagena_28_May_1708-320x213.jpg https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=3422
O ator espanhol Javier Bardem em cena de “O Amor nos Tempos do Cólera” (Foto Divulgação)

Quem se lembra da passagem do romance “O Amor nos Tempos do Cólera”, de Gabriel García Márquez (1927-2014), em que o personagem Florentino Ariza contrata um menino para mergulhar e tentar achar o mítico navio San José, nas profundezas do litoral de Cartagena, para que, com a fortuna encontrada, ele pudesse encantar e seduzir o amor de sua vida, Fermina Daza?

Pois esse navio existe e, em 2015, eu estava em Cartagena quando o então presidente colombiano, Juan Manuel Santos, anunciou que ele havia sido finalmente localizado, mais de 300 anos depois de ter naufragado. Armou-se, então, uma polvorosa entre buscadores de tesouros, políticos e diplomatas. A quem pertenceria, nos dias de hoje, aquela embarcação que, segundo os registros históricos, tinha afundado com 200 toneladas de ouro e outras riquezas, tiradas das então colonias espanholas na América e que rumava para a Espanha, em 1708? As ex-colônias de onde o ouro e as pedras preciosas haviam sido tiradas, hoje o Peru, o Equador, a Bolívia e a própria Colômbia teriam direito a reclamar o tesouro, se na época eram parte do território espanhol? A polêmica estava armada.

Pois, na tarde deste sábado, em Bogotá, os dois países chegaram a um acordo. A vice-presidente colombiana, Marta Lucía Ramírez, e o chanceler espanhol, Josep Borrel, em visita ao país, decidiram que, assim que for resgatado, o tesouro do navio não será explorado comercialmente. Além disso, os dois países farão juntos os esforços de retirá-lo do fundo do mar. A dificuldade tem permeado os diálogos desde então, afinal, além de estar muito fundo, o navio é pesado e a retirada em sua integridade seria altamente custosa. Há empresas norte-americanas de busca de tesouros interessadas, mas os dois países recusam essa ajuda.

Pois se a cooperação binacional para recuperar o San José deve ser comemorada, por outro lado, continuam as divisões sobre o que fazer com o conteúdo da embarcação. A Colômbia considera que se trata de um tesouro colombiano, importante também para o imaginário cultural do país, e gostaria de construir um museu para contar sua história e manter seu conteúdo ali mesmo, em Cartagena. Já a Espanha considera que, por ter sido um navio do Estado espanhol e que, com ele, morreram 600 marinheiros espanhóis, não haveria dúvidas de que deveria ser transportado para a Espanha. Onde se fariam, também, trabalhos de identificação dos mortos e uma devida homenagem.

O navio sucumbiu por uma emboscada da Marinha da Inglaterra destinada a impedir que as riquezas servissem a Felipe 5º, um Bourbon, em guerra pela sucessão do trono espanhol. Inglaterra, Portugal e Alemanha não queriam que ele ficasse com o trono, e sim que assumisse, em seu lugar, um Habsburgo. Ou seja, afundar o San José foi uma estratégia de guerra e, se este pudesse ter chegado a seu destino, poderia ter financiado ainda mais a Coroa espanhola para a guerra e alterado a geopolítica europeia da época.

Construído em 1698, em San Sebastián, em sua última viagem o San José foi carregado num porto panamenho e se aproximava de Cartagena para uma escala. Dali iria para Havana e, depois, para Cádiz (Espanha), o destino final. Próximo de Cartagena, porém, o San José foi emboscado por navios chefiados pelo capitão Charles Wager. Uma batalha naval de dois dias terminou com a derrota dos espanhóis, e o San José sucumbiu no dia 8 de junho de 1708.

 

 

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Morre o escritor Leopoldo Brizuela https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2019/05/14/morre-o-escritor-leopoldo-brizuela/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2019/05/14/morre-o-escritor-leopoldo-brizuela/#respond Tue, 14 May 2019 14:30:41 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=3334
Leopoldo Brizuela, morto nesta terça-feira (Foto Divulgação)

O escritor Leopoldo Brizuela, 55, morreu nesta terça-feira (14), em Buenos Aires, causando surpresa e tristeza no meio literário argentino. A causa ainda não havia sido revelada até o fechamento deste texto. Brizuela havia ganho o prêmio Alfaguara de 2012 por “Uma Mesma Noite”, lançado no Brasil pela Alfaguara.

Considerado um dos principais autores de sua geração, Brizuela vivia em La Plata, e perdeu sua biblioteca em 2013, quando houve uma grande inundação na cidade.

Antes, havia estudado em Cambridge e cursado direito e letras na Universidade Nacional de La Plata, uma das mais importantes do país.

Seu primeiro romance, “Tejiendo Agua”, saiu em 1985, e ganhou o prêmio da Fundação Amalia Lacroze de Fortabat. Também era conhecido por seu trabalho como tradutor, tendo vertido ao espanhol obras de Henry James e Flannery O’Connor, entre outros.

Outro de seus livros que tiveram projeção internacional foi “Inglaterra – Una Fábula” (1999), vencedor do prêmio Clarín de Romance.

Em 2012, entrevistei Brizuela por conta do prêmio que havia ganho, em Buenos Aires. “Uma Mesma Noite” é uma reflexão sobre a ditadura na Argentina.

Brizuela aborda o tema por meio de uma ótica pessoal, pois é ambientado em La Plata, baseado em histórias que ouviu de pessoas conhecidas. O livro se passa em dois momentos, durante a ditadura e em 2010, quando, ao testemunhar um assalto, o protagonista, que é um escritor, como Brizuela, lembra-se da noite em que era um garoto e tocava piano enquanto seus pais eram interpelados por um “grupo de tarefas”, os repressores do regime militar, na sala de jantar da mesma casa.

“O que salva o personagem é a literatura, não porque por meio dela encontre respostas, mas porque o mantém confuso e com capacidade de seguir questionando”, contou Brizuela na época.

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Hay Festival reúne em Cartagena nova literatura da região https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2018/01/21/hay-festival-reune-em-cartagena-nova-literatura-da-regiao/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2018/01/21/hay-festival-reune-em-cartagena-nova-literatura-da-regiao/#comments Sun, 21 Jan 2018 21:59:50 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=3048
Como em todos os meses de janeiro, Cartagena recebe o Hay Festival (Foto Divulgação)

A cidade histórica de Cartagena, na Colômbia, uma das principais fontes de inspiração de Gabriel García Márquez (1927-2014), celebra entre os próximos dias 25 e 28 de janeiro mais uma edição do Hay Festival.

Neste ano, estão entre os destaques uma mesa sobre o Maio de 1968 na América Latina, comandada pelo jornalista norte-americano Jon Lee Anderson, um debate sobre Cervantes e Shakespeare, com a mexicana Valeria Luiselli e o anglo-indiano Salman Rushdie, e ainda as participações do sul-africano J.M. Coetzee, dos colombianos Juan Gabriel Vásquez e Hector Abad Faciolince e do norte-americano David Rieff, entre outros.

No Hay Festival também será divulgada a publicação de “Bogotá 39”, uma reunião dos melhores textos de ficção escritos por autores escolhidos para o projeto, cuja primeira edição ocorreu em 2007 e tomou como inspiração a idade que tinha Gabo quando escreveu “Cem Anos de Solidão”.

Em 2007, 39 escritores foram escolhidos por um jurado e tiveram seu trabalho divulgado por meio de coletâneas e participações em festivais. O “Bogotá 39” conseguiu o que tantas décadas de convivência geográfica não conseguiram fazer: promover intercâmbio entre jovens autores de distintas partes da América Latina.

Entre os escolhidos da mais recente edição do projeto estão o colombiano Felipe Restrepo Pombo, também diretor da “Gatopardo”, os mexicanos Valeria Luiselli e Emiliano Monge, a argentina Samanta Schweblin e o chileno Gonzalo Eltesch. Do Brasil, estão Natalia Borges Polesso e Mariana Torres.

Em geral, se privilegia quem lançou por editoras pequenas, que nos últimos anos tiveram um “boom”, principalmente no México, na Argentina e na Colômbia. Mas, se olharmos para a lista do primeiro “Bogotá 39”, vemos que seus autores já estão ou em grandes editoras ou já ganharam grande projeção internacional, como Guadalupe Nettel, Junot Díaz e Jorge Volpi.

Em Cartagena, fica dada a largada no circuito de festivais literários da AL em 2018.

]]> 1 Por que Medellín é tão especial? https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2016/12/02/por-que-medellin-e-tao-especial/ https://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/2016/12/02/por-que-medellin-e-tao-especial/#comments Fri, 02 Dec 2016 03:04:00 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://sylviacolombo.blogfolha.uol.com.br/?p=2649 Imagem da homenagem às vítimas do acidente, em Medellín (Foto El Colombiano)

Imagem da homenagem às vítimas do acidente, em Medellín (Foto El Colombiano)

Em seu mais famoso relato de não-ficção, “Notícia de Um Sequestro”, Gabriel García Márquez (1924-2014) afirma que os “paisas” (habitantes da região de Antioquia, cuja capital é Medellín) combinavam de uma forma muito particular “a reza e a parranda” (parranda significa festa, de modo geral).

Aos brasileiros que se comoveram com a linda homenagem que o Atlético Nacional de Medellín e os moradores da cidade fizeram aos jogadores do Chapecoense e às demais vítimas do acidente aéreo desta semana, os “paisas” deram mais uma prova de serem uma sociedade muito especial, dentro de um país que é nosso vizinho, mas que conhecemos tão pouco. Medellín é colombiana em sua essência, mas possui uma personalidade muito própria, marcada pela solidariedade, pela força dos laços familiares, pela fé e pelo gosto pela festa coletiva.

No livro mencionado, o costenho García Márquez observou os “paisas” quase como um estrangeiro. Gabo nunca viveu em Medellín. Conhecia bem as características dos caribenhos, pois nascera naquela região, antipatizava levemente com certa arrogância da elitista Bogotá, mas em Medellín se deparou com um desafio. Como uma sociedade era capaz de produzir um contexto de extrema violência _que era, exatamente, a razão pela qual ele escrevia sobre ela, afinal, “Notícia” é um relato sobre uma série de crimes cometidos pelo Cartel de Medellín_ e ao mesmo tempo atravessar esses anos de forma tão compacta, tão forte, e com tanta união entre seus cidadãos?

A literatura mesmo oferece outras chaves. Uma obra de um antioquenho célebre, “El Olvido que Seremos”, de Hector Abad Faciolince, vai no centro da questão. Trata-se de um relato memorialista. O autor teve o pai, um médico e defensor dos direitos humanos, assassinado por paramilitares quando ele era pouco mais que um adolescente. Já sabemos isso desde o começo da leitura, mas a obra tem uma força narrativa descomunal desde a primeira linha, porque Abad Faciolince a constrói não para mostrar como era a violência em Medellín, apesar de este ser sempre o pano de fundo, mas sim como se formavam os círculos de amizades, de afetos e a as vidas familiares na Medellín em que ele cresceu, em tempos tão difíceis. Apesar de a história terminar com uma tragédia, encerra-se também com uma mensagem de esperança. A de que a força está no outro, no apoio dos que te rodeiam, sejam eles de seu próprio sangue ou não.

Medellín ainda carrega de modo sofrido esse rótulo de ter sido, por vários anos, uma das cidades mais violentas do planeta. Justamente durante os tempos da atuação do cartel liderado por Pablo Escobar (1949-1993). Não ajuda nada que tanto se celebre sua imagem como ícone cultural nos dias de hoje. Escobar foi um monstro surgido num contexto que precisa ser mostrado e entendido para jamais ser repetido. Não estampado em camisetas vendidas nas esquinas das grandes cidades como se fosse um ídolo nacional.

Mas o que vale ressaltar aqui é o que Medellín conquistou depois de 1993, ano em que o chefão do narcotráfico foi morto. Muitos apontam que a esperança surgiu com uma série de gestões de prefeitos e governadores progressistas, com uma visão de que mudanças urbanísticas poderiam transformar a sociedade.

De fato, a aposta, iniciada por Sergio Fajardo quando foi prefeito da cidade (2003-2007), e continuada por seus sucessores, foi correta. Mas não basta para explicar porque a cidade, de sangrenta e perigosa, se transformou em uma urbe moderna e generosa. Andar de “metrocable”, o sistema de teleféricos que une periferia e centro, poderia ter se consolidado apenas como uma facilidade para as pessoas que vivem no subúrbio chegarem mais rápido ao trabalho (o que por si só seria muito valioso). Mas não, o “metrocable” virou também um passeio de fim de semana e um programa turístico. É, ao mesmo tempo, um modo de famílias de classe média levarem os filhos para conhecer as partes altas da cidade, e também um meio para que os habitantes das favelas tenham acesso mais rápido às ofertas de diversão do centro, entre elas o futebol.

Além das inovações nos transportes, houve também grande investimento na rede de museus e bibliotecas. Mas, novamente, elas de nada adiantariam se, como no caso do “metrocable”, não fossem abraçadas e incorporadas pela sociedade. Essas obras são concebidas para serem inclusivas e acessíveis, e assim foram recebidas.

Entre a costa alegre e festeira e a capital sofisticada e europeia, Medellín é uma Colômbia à parte. Uma sociedade também da montanha, com fama de trabalhadora e religiosa, e que aprendeu, ao longo de décadas de percalços, a ser solidária para atravessar junta períodos difíceis.

Já é hora de parar de associar Medellín ao perigo e à violência. E sim de celebrar Medellín por sua imensa generosidade, e por ser capaz de chorar mortos que não são os seus, de estender a mão ao outro que está sofrendo, mesmo que este seja um desconhecido. De unir, como definiu Gabo, “reza e parranda” também para consolar o próximo em um momento de terrível luto como o que assistimos nesta semana.

Foi bonita e emocionante a festa, Medellín. Gracias.

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