Ditadura argentina em dez filmes
A Argentina relembra neste 24 de março o golpe militar mais duro que viveu no século 20 _sim, houve vários golpes. No regime, que foi de 1976 a 1983, estima-se que mais de 20 mil pessoas tenham desaparecido, enquanto 500 bebês foram roubados. Há no país toda uma literatura e uma cinematografia dedicada a tratar desse período.
Aqui, vão dicas de dez filmes sobre esse tempo que não deveria voltar nunca mais. E o cinema nos ajuda a entender as razões.
“A História Oficial”
(Luis Puenzo, 1985)
Vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro, conta a história da professora de história Alicia Manet de Ibáñez, vivida por Norma Aleandro (uma espécie de Fernanda Montenegro da Argentina). Apesar de dar aulas sobre o passado do país, Alicia ignora o presente e só depois de questionada por estudantes começa a refletir sobre o que está acontecendo e a desconfiar de que sua filha adotiva possa ter sido roubada de guerrilheiros mortos pela repressão. O filme tem o grande mérito de refletir sobre o período no calor dos acontecimentos, com a nova democracia ainda engatinhando e a incerteza sobre uma possível volta dos militares no ambiente.
“Tangos, o Exílio de Gardel”
(Fernando Solanas, 1985)
Também filmado pouco depois da retomada democrática, o filme conta a história de um grupo de argentinos exilados em Paris (como ocorreu com o próprio diretor), que tenta armar um espetáculo dedicado ao cantor Carlos Gardel. Solanas dirigiu outros bons filmes sobre a política argentina, como “La Hora de los Hornos”. Solanas foi também senador e morreu de Covid-19 neste ano, na mesma Paris em que filmou sua obra mais conhecida.
“Infância Clandestina”
(Benjamín Avila, 2012)
Nesta co-produção com o Brasil, conta-se a história a partir da trajetória de um garoto cujos pais são montoneros que retornam ao país, em 1979, numa tentativa fracassada de tomar o poder dos militares. Juan (Teo Gutiérrez Romero) tem de mudar de nome, de escola e esconder sua verdadeira história, enquanto os pais treinam e organizam a ação que, de modo trágico, arruinará a família. A história é baseada em fatos reais relacionados à vida do próprio diretor, Benjamín Ávila. Na Argentina daquela época, várias crianças cresceram na clandestinidade e pouco se lembram da luta de seus pais.
“Kóblic”
(Sebastián Borensztein, 2016)
Arrependido de ter de pilotar “voos da morte”, em que opositores do regime eram atirados das alturas no mar, o capitão Kóblic (Ricardo Darín) busca esconder-se num vilarejo da Província de Buenos Aires, com uma nova identidade. Sua tentativa de passar despercebido, porém, vai sendo desmascarada por um velho policial da região (Óscar Martínez). Atormentado pelo seu passado, Kóblic tenta inventar uma nova vida e se apaixona. Porém, o regime militar o ameaça psicologicamente e de modo concreto.
“Buenos Aires Viceversa”
(Alejandro Agresti, 1996)
Uma espécie de “Short Cuts” portenho, mistura diferentes linhas narrativas para contar a história de filhos de desaparecidos depois de adultos. A protagonista, uma órfã que não sabe nada sobre seus pais, é contratada por um casal de idosos para filmar Buenos Aires para eles. Os dois se negam a sair de casa, à espera da filha que foi para a universidade e nunca voltou. No caminho da moça, passarão diversos personagens com vínculos íntimos, porém dissimulados, com a ditadura.
“Garage Olimpo”
(Marco Bechis, 1999)
Uma jovem de 18 anos, Maria Fabiani, é levada pelo exército argentino e torturada na prisão clandestina conhecida como Garage Olimpo. Seu torturador, curiosamente, é um jovem que vivia de aluguel na casa da mãe de Maria e tinha por ela uma paixão não-resolvida. Enquanto Maria passa pelas sessões de tortura e vive um inusitado flerte com o torturador, sua mãe sai em busca dela por Buenos Aires.
“El Mismo Amor, la Misma Lluvia”
(Juan José Campanella, 1999)
Do mesmo diretor do premiado “O Segredo de Seus Olhos” (e com o mesmo casal protagonista, Ricardo Darín e Soledad Villamil), o filme conta uma história de amor com muitos encontros e desencontros, que começa nos anos 80 e vai até o final da década de 90. O pano de fundo é a história argentina durante o final da ditadura, a Guerra das Malvinas e o começo dos anos Menem.
“Kamchatka”
(Marcelo Piñeyro, 2002)
A ditadura vista pelos olhos de uma criança de dez anos. Seus pais, fugindo dos militares, vividos por Cecila Roth e Ricardo Darín, levam o garoto para uma casa fora de Buenos Aires. No lugar, uma das poucas alternativas de passar o tempo era jogar uma variante do nosso War, em que Kamchatka, uma província russa, parecia um lugar de refúgio e esperança. Quando por fim o casal desaparece, é a lembrança desse lugar que o garoto guardará dos pais.
“Iluminados por el Fuego”
(Tristan Bauer, 2005)
A tentativa de suicídio de um ex-soldado que lutou na Guerra das Malvinas (1982), nos dias de hoje, faz com que um de seus companheiros relembre o período em que participaram do delírio dos comandantes militares de então, que fizeram suas tropas formadas por garotos acreditarem que seria possível vencer a Inglaterra numa batalha pelas ilhas Malvinas/Falklands. As comoventes cenas finais foram gravadas nas próprias ilhas pela primeira fez no cinema argentino.
“Crónica de una Fuga”
(Adrián Caetano, 2006)
Baseado numa história verídica, conta uma tentativa de fuga de um grupo de prisioneiros da temida Mansion Seré, um centro de detenção e tortura. Entre eles, estava Claudio Tamburrini, goleiro de um time de futebol que virou símbolo da luta contra a repressão depois do episódio. Realizado num momento de alta do cinema argentino no cenário internacional, o filme teve ampla repercussão internacional.