Oposição venezuelana cai na mesma armadilha pela segunda vez

Neste domingo (2), a oposição venezuelana ao chavismo caiu na mesma armadilha de 2005. Ao não encontrar uma estratégia eficiente para enfrentar a ditadura de Nicolás Maduro, decidiu que boicotará as eleições legislativas marcadas para o próximo dia 6 de dezembro. Assim, abre espaço para a possibilidade de que o regime continue no poder por tempo indeterminado, mesmo com a grave crise econômica e humanitária pela qual passa o país e com o nível baixíssimo de popularidade de Maduro (13%, segundo o Datanálisis).

A decisão dos 27 partidos, incluindo os mais importantes da oposição (Ação Democrática, Copei, Voluntad Popular e Primero Justicia), foi anunciada em um comunicado. Nele, as agrupações enumeram as razões, todas elas legítimas, para não participar do pleito. Entre elas: a formação inconstitucional no novo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), a inabilitação de atores políticos importantes, a intervenção no diretório dos partidos, a falta de convocação de observadores internacionais qualificados, a existência de presos políticos e o histórico recente de fraudes nas últimas eleições presidenciais e regionais.

Mas, se os motivos são justos, por que boicotar não é a melhor saída? Porque, como bem disse o analista político Luis Vicente León em entrevista à Folha, deixar de participar tirará desse grupo a única coisa que possui, que é a legitimidade dos cargos que conquistaram em 2015, na última eleição venezuelana de fato reconhecida como legal pela comunidade internacional. E “se quando tinham os cargos os parlamentares opositores não conseguiram seus objetivos, não será como poder alternativo, que sequer tem a ratificação do voto popular, que irão conseguir.”

Participar da eleição como se fosse uma partida de futebol com o campo inclinado a favor da ditadura tampouco é uma boa opção. Mas esta estratégia já foi tentada, em 2005, e mostrou-se um colossal erro. Nas eleições legislativas daquele ano, os principais partidos de oposição, por razões parecidas, também decidiram-se pelo boicote. O resultado foi terem demorado 10 anos para voltar a ter voz política no parlamento. E, com isso, deram uma década inteira ao chavismo para que centralizasse ainda mais o poder.

Em 2005, a coalizão chavista ficou com 90% da Assembleia Nacional. O resto do parlamento ficou com partidos pequenos e desimportantes. Chávez, na época, chegou a decretar a morte da oposição: “esses partidos (referindo-se aos que se abstiveram de participar) já cumpriram sua parte e creio que chegou a hora de sua morte. De suas cinzas surgirão novos líderes e grupos de oposição”. Com a frase, referia-se, ao falar de uma “nova oposição”, à parte desta que foi literalmente comprada por subornos, ou que recebeu favores indevidos, apenas para fingir que a Venezuela era uma democracia. Mais ou menos o que Maduro está fazendo hoje com dissidentes como Luis Parra, ex-integrante do partido Primero Justicia, e que vem se prestando ao papel de fantoche como “líder da AN” aos olhos do regime.

É compreensível que a oposição não veja um cenário ideal e competitivo na eleição de dezembro. Não há mesmo, a Venezuela é uma ditadura. Porém, dividir-se e sair fora do cenário eleitoral não parece ser a melhor estratégia. Talvez seja o momento de unir-se novamente num novo projeto, como já se tentou antes, com a formação da MUD (Mesa de la Unidad Democrática), em 2008, ou com o referendo de julho de 2017, ou mesmo com a autoproclamação de Juan Guaidó, em 2019. Quando apresentados a uma proposta nova e entusiasmante, os venezuelanos respondem em apoio, saem às ruas. As três iniciativas citadas falharam, é certo, mas foram tentativas que unificaram as forças da oposição e propuseram algo interessante, uma saída para a situação do país.

Agora não é o momento de ausentar-se, mas sim o de dar um novo passo e de articular as forças e atores políticos de modo diferente, com uma nova estratégia. Senão, o regime ditatorial venezuelano, mesmo que frágil das pernas, terá espaço para continuar causando estrago no país e expulsando dele milhões de cidadãos venezuelanos.