Buenos Aires descobre que tem milhares de moradores de rua
Eles estão nas ruas durante todo o ano, porém, passam meio desapercebidos durante os meses de calor ou de frio moderado. Para muitos, são apenas um amontoado de gente que se encolhe diante de bancos, edifícios públicos que mantêm luz à noite, entradas de metrô e outros locais. Só que o aumento da pobreza, que hoje chega a atingir 35% da população argentina, mostra sua cara mais feia no inverno. Neste ano, devido ao pedido de ajuda dessas pessoas, se contrapôs o número oficial do governo para os sem-teto, de 1.146, com a realidade vista e com estudos de organizações de direitos humanos, que dizem que a cifra já é de mais de 8 mil pessoas.
Estamos em dias de onda polar, em que as temperaturas estão em um dígito durante boa parte do dia, e caem para negativo à noite. Se para a classe média sair para trabalhar entre 7h e 9h da manhã, com -0,5 graus de sensação térmica do lado de fora já é duro, imaginem para a população de rua.
A parte “positiva” dessa situação é que diversas entidades, clubes e universidades decidiram abrir suas portas, uma vez que os abrigos do Estado não dão conta do fluxo e que os próprios moradores de rua não gostam, porque dizem que ali são frequentemente roubados. O primeiro foi o River Plate, mas outros o seguiram, como o Gimnasia e o Ferro. A Universidade de La Matanza, na periferia bonaerense, fez o mesmo. Outros clubes e escolas também. Nestes lugares, voluntários se apresentaram para, durante o dia, recolher ajuda levada pelas pessoas: cobertores, agasalhos, ingredientes para sopas e para o café da manhã. A partir das 18h, vão chegando os moradores de rua, que recebem seu kit, jantam, e passam a noite sob um teto, e se alimentam pela manhã antes de voltar para o céu aberto.
É bonito ver a solidariedade de boa parte da sociedade civil. Porém, fica evidente que esse problema apenas vêm aumentando. Quando apenas se divulgam cifras da pobreza, não é possível sentir de fato o que é a mendicância. Mas quando se veem famílias inteiras que armam pequenos acampamentos, alguns, sob viadutos, com fogueiras, embrulhados em cobertores velhos ou em papelão, dói mais a todos. Deveria doer aos políticos, especialmente aos que concorrem em outubro por um cargo, seja de presidente, governador, prefeito ou deputado. A Argentina de hoje não é a mesma de décadas atrás. A população pobre está aumentando e, com isso, o número dos que vivem na rua. Estes sofrem muito, especialmente quando os termômetros estão marcando essas baixas temperaturas. Neste ano, foram registradas 5 mortes até agora, e o inverno apenas começou.
Especialmente para as grandes cidades, é urgente que se desenhem políticas públicas para mitigar o problema. O retrato das famílias dormindo na rua com temperaturas negativas é o sinal claro de que os projetos dos governos recentes não deram certo.