Argentina indica para o Oscar filme sobre serial killer

Sylvia Colombo
Cena do filme “El Ángel”, que representará a Argentina no Oscar (Foto Divulgação)

O filme escolhido para representar a Argentina no próximo Oscar de melhor filme estrangeiro se passa nos anos 1970, embora pouco tenha a ver com a turbulência e a violência política daquela década. Trata-se de uma cinebiografia, que vem causando muita controvérsia, de um assassino e assaltante serial, Carlos Robledo Puch _que na época do filme estava às vésperas de completar 20 anos, e hoje segue cumprindo pena de prisão perpétua pelos 11 homicídios (conhecidos) pelos quais foi responsabilizado. A direção é de Luis Ortega (da série “El Marginal”), com co-produção da empresa de Pedro Almodóvar (El Deseo), e com o jovem ator Lorenzo Ferro no papel principal.

A trama acompanha pouco mais de um ano (entre 1971 e 1972), em que Robledo Puch cometeu seus principais crimes. Seu ar angelical, de cabelo loiro e cacheado e uma sensualidade misteriosa jamais passariam a sensação de que este garoto seria um frio assassino. Começamos vendo-o fazendo odes à liberdade, acelerando pelas ruas de Buenos Aires a bordo de motos roubadas, inserido no contexto (roupas, música) do mundo hippie e roqueiro dos anos 1970. Quando o vemos em ação, porém, transforma-se num gênio dos arrombamentos a mansões e joalherias, dos ataques a queima-roupa, num curioso em observar, depois, o resultado de suas ações.

As pessoas que o rodeiam não o entendem. A mãe, interpretada pela excelente Cecilia Roth, aqui uma dona de casa de classe média baixa, fareja que ele anda em problemas, mas não consegue associar seu modo carinhoso de ser com o tamanho das monstruosidades que o filho anda fazendo. Nem mesmo seu parceiro de crime, interpretado por Chino Darín, chega a ter intimidade com ele, o contesta, brigam, e ao fim, bem, sem spoilers…

O verdadeiro Robledo Puch, que hoje cumpre pena de prisão perpétua (Foto Arquivo)

O filme tem ritmo de thriller e é muito atraente visualmente, transportando o espectador para aquela época e aquela Buenos Aires, tanto a que estava às vésperas de um golpe de Estado e que vivia uma palpável sensação de repressão no ar, como a que também recebia, simultaneamente, uma explosão da cultura jovem e rebelde.

As polêmicas, porém, não tardaram em chegar. Primeiro, o próprio Robledo Puch escreveu desde sua cela, dizendo que nem o livro em que é baseado o filme nem o mesmo o retratam ou entendem suas motivações. Depois, houve quem visse certa glamourização da imagem do garoto, que no fundo é um assassino cruel. Indagado pelo pai se ele aceitaria que um advogado apresentasse uma defesa em que ele fosse declarado louco, para tentar diminuir sua pena, Robledo Puch diz que “não, porque eu sou normal”.

Talvez haja um pouco de romantização da criminalidade, mas ela não é culpa dos que realizaram o filme. O menino Robledo Puch era de fato chamado de “anjo” pela imprensa da época, por seus cabelos loiros e cacheados e olhar sensual, que seduzia homens e mulheres, tinha uma doçura nos modos e ao falar, sem que nada disso diminuísse os horrores que causou.

A obra já foi vista por mais de um milhão de pessoas na Argentina, e foi elogiada em Cannes. Faz parte de uma nova boa cepa de novos filmes locais. A ver se tanto ao ponto de seguir os passos dos já “oscarizados” “A História Oficial” e “O Segredo de Seus Olhos”.