Colômbia, um passo à frente, dois para trás

Sylvia Colombo
Manifestantes pró-matrimônio gay, em Bogotá (Foto AP)
Manifestantes pró-matrimônio gay, em Bogotá (Foto AP)

Por incrível que pareça, a Colômbia se predispõe a tomar mais uma decisão por meio de um plebiscito, poucos meses depois de o país ter cindido em dois com a votação sobre o processo de paz. Desta vez, será para escolher entre seguir dando passos firmes em direção a uma sociedade igualitária, com mais liberdade e direitos civis a todos ou continuar sendo um país extremamente conservador, e que permite que crenças religiosas de uns ditem políticas que valem para todos.

O tema em questão é a adoção por casais homossexuais. Ou melhor, a adoção por casais, indivíduos ou grupos familiares, que não sejam compostos pela tradicional formação “homem e mulher”. Tudo começou quando a Corte Constitucional do país, há um ano, permitiu a adoção de crianças por parte de casais do mesmo sexo. A decisão revoltou líderes religiosos cristãos e evangélicos, que iniciaram intensa campanha para derrubar a medida.

Quem capitaneou o movimento foi a senadora evangélica Viviana Morales, que recolheu mais de dois milhões de assinaturas para um pedido de reescritura de um artigo da Constituição, tornando a adoção algo que só poderia ser exercido por famílias constituídas pelo casamento de homem e mulher. O pedido já recebeu um primeiro “sim” do Senado e agora deve passar por mais um debate parlamentar para o aval final. Vencidas ambas etapas, o assunto iria para votação num referendo.

Um dos problemas é que a medida, se aprovada, não apenas impedirá a adoção por parte de casais gays, mas também por parte de viúvos, divorciados e solteiros em geral, antes perfeitamente habilitados para isso e amparados pela Constituição. “Se isso passa, estaremos dando um péssimo sinal para a sociedade, estaremos dizendo que na Colômbia há cidadãos e famílias de primeira e segunda classe”, disse a senadora progressista Claudia López.

O texto do pedido de Morales justifica a medida como de “proteção a meninos e meninas, e garantias de que receberão edução de uma família formada por um matrimônio de fato”. A senadora se aferra a dados de pesquisas recentes que indicam que 85% dos colombianos são contra a adoção igualitária. O marido de Morales, um ex-guerrilheiro do M-19, diz que a medida evitaria a “homossexualização da sociedade”.

A possibilidade de que o “sim” saia vitorioso nesse caso é muito grande. Ainda está na memória de todos como a chamada “ideologia de gênero” ajudou a derrubar o acordo de paz no plebiscito de 2 de outubro.

Em entrevista à Folha, o próprio presidente Juan Manuel Santos admitiu ter minimizado a importância que a visão religiosa da família tem para boa parte da sociedade colombiana.

Na última semana, Santos alarmou-se com o andamento acelerado da medida no Congresso, e se posicionou contra o plebiscito. “Não estou a favor dessa posição. Nós somos um governo que promoveu os direitos de todos os colombianos, incluindo as minorias raciais, étnicas e os homossexuais.”

O caso é que, por ora, Santos não tem muito a fazer que esperar o desenvolvimento do processo. O que parece ficar muito claro é que a “ideologia de gênero” é um assunto que chegou para ficar na pauta da discussão política na Colômbia, e deve ser um dos temas-chave da eleição legislativa e presidencial de 2018.