Mais ambientalistas assassinados na América Central

Sylvia Colombo
A ambientalista Berta Cáceres, líder assassinada em março (Foto Reuters)
A ambientalista Berta Cáceres, líder assassinada em março (Foto Reuters)

Conversando com os rapazes do valente site salvadorenho “El Faro”, há poucas semanas, durante o encontro da Fundação Nuevo Periodismo, em Medellín, fiquei sabendo das dificuldades de se fazer jornalismo num país como Honduras. “Não tem ninguém fazendo isso profissionalmente lá, não temos a quem contatar quando acontece algo, e se nós não olhamos e reportamos, quase mais ninguém faz”, me dizia José Luiz Sanz, diretor do meio, cuja sede é em San Salvador, mas a área de cobertura se estende pelo resto da América Central. Me dei conta disso nesta quarta-feira (19), enquanto buscava mais informações sobre o assassinato de mais dois líderes ambientalistas neste violento país. O que encontrei nos exíguos meios locais era parco e disperso, e a melhor fonte de informações, no caso, era realmente o site do “El Faro”.

Os problemas com os ambientalistas em Honduras começaram em 2009, quando um golpe de Estado depôs o presidente Manuel Zelaya. Desde então, o país vive uma verdadeira epidemia de violência contra cidadãos engajados em movimentos ambientalistas e de proteção à propriedade de camponeses humildes e de proteção ao ambiente. Desde 2010 para cá, foram 118 ativistas assassinados, segundo a ONG Global Witness.

A mais significativa dessas mortes, até aqui, foi a de Berta Cáceres, ambientalista reconhecida internacionalmente _havia ganhado o Goldman Environmental Prize por opor-se a um dos maiores projetos hidrelétricos já projetados para a região, mas que destruiria uma importante fonte de água da população local e um conjunto de cascatas que configuravam um local sagrado para os indígenas da região. Depois de receber várias ameaças, Cáceres teve sua casa invadida de madrugada, em março deste ano, por 11 homens, que ali a executaram a tiros. O caso ganhou mais projeção internacional que os outros, por tratar-se de uma ambientalista conhecida, mas embora tenha movido protestos e mobilizado atenção pelo mundo, essas coisas pouco contribuíram para que as mortes parassem. O jornal britânico “The Guardian” chegou a publicar uma denúncia, por meio de uma reportagem, de que o nome de Cáceres, assim como os de outros ambientalistas, figuravam em uma lista do Exército de líderes a serem eliminados. A indignação fora, porém, não se traduziu em Justiça dentro de Honduras. Até hoje, algumas pessoas foram detidas, mas nenhum julgamento iniciado nem ninguém indiciado. O mesmo ocorre para as outras mais de 100 mortes.

As desta semana foram de dirigentes do MUCA (Movimento Unificado Camponês do Aguán), José Angel Flores e Dilmer Dionicio Jorge, mortos a tiros quando chegavam em casa. O MUCA atua na região do Bajo Aguán, em conflito desde os anos 1990. Nessa época, os camponeses da região foram expulsos por fazendeiros que diziam ser os donos das terras, amparados por uma nova lei agrária. De tempos em tempos, os camponeses reocupam a região, gerando conflitos que já mataram mais de 170 pessoas. Durante a gestão Zelaya, houve uma tentativa de apaziguar o conflito por meio de uma acordo entre as partes, mas sua saída do poder enfraqueceu os camponeses, e a região hoje é altamente militarizada. Movimentos como o MUCA, entre outros, tentam recuperar terras perdidas. A longevidade do conflito deu origem também a milícias paramilitares, deixando a perspectiva de paz cada vez mais distante.

Já os seguidores de Cáceres, cuja principal preocupação era preservar as fontes de água e as pequenas propriedades da expansão da mineração e do agronegócio, seguem na mira do fuzil. Recentemente, escaparam de atentados seu substituto à frente da organização Conselho Cívico de Organizações Populares e Populações Indígenas, Tomás Gómez Membreño, e outro integrante do movimento, Alexander García.

A ausência de meios de informação locais isola ainda mais o problema. Que a comunidade internacional dê prêmios a esses líderes ajuda de certo modo a dar visibilidade à questão, mas não ameaça quem está por trás dessas atrocidades. O fato de Honduras ter ainda muitas outras deficiências relacionadas a segurança e desigualdade apenas agravam a situação. Como a imigração de latinos vindos da América Central é tema tão importante para a campanha eleitoral norte-americana, seria interessante ouvir de algum candidato uma proposta para apaziguar a região. Enquanto isso, o silêncio dos blocos de países latino-americanos sobre o caso tampouco ajuda. A perspectiva, infelizmente, é que essas terríveis mortes sigam ocorrendo e continuem impunes.