O momento Marie Antoinette de Mauricio Macri

Sylvia Colombo

“Se vocês estão em casa de camiseta e descalços, é porque estão consumindo energia demais.” Mauricio Macri pode ter a fama de ser um bom gestor, e foi com a esperança de que sua mentalidade empresarial tire a Argentina da crise que as pessoas o elegeram, em dezembro do ano passado. Mas, quando o assunto é habilidade política para transmitir más notícias, necessidades de ajustes ou de demonstrar conhecer as dificuldades pelas quais passam os mais de 30% de pobres que existem na Argentina, aí seu desempenho é abaixo do aceitável. Macri ainda precisa aprender muito sobre como fazer e transmitir a política no dia-a-dia.

É por isso que frases desastradas como essa (que soam como a “Se não têm pão, que comam brioches”, atribuída a Maria Antonieta ao saber que o povo francês passava fome) soaram como ofensa a idosos e famílias carentes para quem as contas de gás e eletricidade subiram mais de 400% desde que Macri começou a implementar as políticas de ajustes e de cortes de benefícios _ao sul do país, onde as temperaturas são baixas o ano todo, os aumentos chegaram a 2.000%. Ao colocar a culpa nas pessoas, que estariam desperdiçando energia demais para ficarem confortáveis em casa durante o inverno, esqueceu-se de que esses elementos são necessários para manter o funcionamento dos hospitais, a comodidade de berçários e escolas e as próprias casas dos trabalhadores da periferia, neste que é um dos invernos mais frios que a Argentina já teve nos últimos 20 anos.

As redes sociais não perdoaram, e foram buscar no Instagram do casal presidencial diversas imagens de ambos justamente usando camisetas e roupas leves em casa, assim como resgataram uma entrevista ao programa de Marcelo Tinelli (o mais popular da Argentina) na qual Macri e Juliana Awada contavam que gostavam tanto de dormir “agarradinhos” que usavam ar condicionado a noite toda.

 

Macri e a mulher, Juliana Awada, vendo jogo da seleção argentina (Foto Reprodução)
Macri e a mulher, Juliana Awada, vendo jogo da seleção argentina (Foto Reprodução)

Macri ainda não completou o primeiro ano de governo. Sua popularidade caiu pouco desde a eleição e muitos argentinos querem crer que seu governo dará certo, ainda mais com a boa resposta do mercado internacional, que vem recebendo bem o retorno de um país menos protecionista e mais aberto ao investimento externo.

Seu ponto fraco, porém, segue sendo o de sempre, a falta de capacidade de construir um discurso político convincente, e uma irresistível tentação de cometer gafes politicamente incorretas que, se contados os anos como prefeito de Buenos Aires, se acumulam em dezenas.

Recentemente, as bolas completamente fora do arco tiveram a ver com sua fortuna pessoal. Primeiro, o presidente, herdeiro de uma das famílias mais ricas da Argentina, havia dito que entregaria todos os seus negócios a um fideicomiso cego. Depois, soube-se que nem tudo havia entrado nesse pacote. Logo, ao promover uma política para estimular empresários que tivessem dinheiro não declarado no exterior a que o trouxessem à Argentina, cometeu outra gafe, incluindo-se entre eles.

“Nós não temos mais que nos proteger ou nos esconder”, disse, como quem comemora, sem se dar conta de que o que faziam antes, evadindo impostos, era um delito. Explicou ninguém seria investigado, obviamente incluindo ele mesmo no pacote.

Os Panamá Papers foram outra saia-justa. Num primeiro momento, Macri disse apenas que havia emprestado o nome para a abertura de uma empresa que jamais tinha entrado em atividade. Depois que um jornalista confrontou-o com uma informação contrária, disse. “Não sei se esteve ativa ou não. É de 1998, são 18 anos.”. Depois, surgiu a misteriosa conta das Bahamas, com 18 milhões de pesos, após Macri dizer que não possuia dinheiro fora do país. Saiu-se com outra frase infeliz, “honestamente, não percebi”, e pôs a culpa no banco, dizendo que este tinha trocado de sede para um paraíso fiscal sem te-lo avisado. Logo, fechou a conta que antes havia dito jamais ter possuído.

As frases descabidas de Macri não se referem só a questões financeiras. São conhecidas suas gafes com relação a mulheres, como quando disse que, no fundo, sabe que elas gostam de ouvir grosserias como “que linda bunda você tem”, ou que os homossexuais “não são pessoas 100% sãs”.

 

Há duas semanas, então, Macri inaugurou sua temporada de frases históricas desastrosas. Ao convidar o ex-rei da Espanha para comemorar o Bicentenário da Independência argentina, disse: “Os cidadãos de 1816 seguramente tiveram medo e angústia ao tomar a decisão de libertar-se da Espanha.” Quase que pedindo desculpas pelo fato de a Argentina, assim como os demais países da América Hispânica, terem lutado por sua Independência.

Pobre San Martín, que cruzou os Andes gelados com seu Exército para lutar contras as tropas realistas naquele ano, entregando à causa da Independência das Américas a vida de milhares de soldados.

Se o prócer pudesse ouvir a frase resignada e desajeitada de Macri, certamente se reviraria no túmulo.