“Seu Nome É Fujimori”
O argumento mais usado pelos apoiadores de Keiko Fujimori para defender sua candidatura nesta eleição é que não se pode culpar os filhos pelos pecados dos pais. De fato, não se pode. Mas, quando a filha em questão fez parte da alta cúpula da ditadura fujimorista (1992-2000) e teve conhecimento dos casos de corrupção e dos abusos de direitos humanos, como fica a questão? Keiko, como primeira-dama do Peru depois que o pai se divorciou de Susana Higushi, estava lá todo o tempo. Seus principais colaboradores hoje são figuras de protagonismo no governo do pai. Dá para achar que ela passará a borracha em tudo, se eleita?
Essa é a questão que propõe o documentário “Su Nombre Es Fujimori”, lançado há poucos dias pelo cineasta peruano Fernando Vílchez. Tão engajado está ele, e boa parte dos artistas, intelectuais e acadêmicos progressistas do Peru, em impedir que Keiko ganhe a eleição (está cinco pontos à frente de seu rival), que Vílchez já o disponibilizou online (link abaixo). A ideia é fazer com que os peruanos jovens ou desmemoriados saibam o que ocorreu naquela década, quando Fujimori fechou o Congresso, calou a imprensa, perseguiu opositores e militarizou o país.
“A ideia era só normalizar a situação, não esperava que se vissem tantos tanques e soldados pela TV. Por aí, acho que me faltou um assessor de imagem.” Parece piada, mas não. Essas palavras foram ditas pelo próprio Fujimori, rindo, dias depois do “autogolpe” de 1992, reclamando que só se estavam mostrando “a parte ruim” do episódio. O documentário contrapõe essas declarações, mais os encontros pomposos de Fujimori com o alto comando das Forças Armadas, com os congressistas se enfrentando com soldados, tentando entrar no parlamento, o jornal “La República” e sua gráfica sendo invadidos pelos militares, rádios saindo do ar com locutores a gritos, dizendo que estavam sendo forçados a se calar.
Com assessoria do jornalista Gustavo Gorriti, preso durante o fujimorismo, e intercalando com as manifestações anti-Keiko dos últimos meses, o documentário faz um resumo do período. Estão ali os bastidores das gravações dos “vladivideos”, em que Vladimiro Montesinos negociava e pressionava empresários a alinharem-se ao governo, e as investigações das matanças realizadas pelo grupo Colina. Criado dentro do Exército, mas para atuar como um esquadrão da morte na clandestinidade, o Colina foi responsabilizado pelos assassinatos de estudantes (La Cantuta) e opositores (Barrios Altos e Santa).
O filme traz ainda gravações feitas nas clínicas de esterilização forçada no interior do país, além dos documentos do Ministério da Saúde distribuindo metas aos médicos das comunidades andinas para que esterilizassem um número pré-calculado de mulheres. Esses documentos fazem parte de um processo ainda em aberto. Condenado a 25 anos de cadeia por abusos de direitos humanos e corrupção, Fujimori ainda está sendo julgado pela esterilização sem consentimento de 250 mil mulheres.
O filme mostra imagens de Keiko nessa época, e contrapõe os spots de campanha de Alberto (baseado no slogan “un peruano como tu”) com os de Keiko nos dias de hoje, que a mostram viajando pelo interior do país, abraçando humildes pelas comunidades mais pobres.
Como obra panfletária e de denúncia, o documentário funciona e passa sua mensagem. Porém, não responde a questão que realmente está no ar nesses dias aqui no Peru. Quem, de fato, é Keiko Fujimori? Apresentada de forma cuidadosa e claramente assessorada por uma equipe de imagem, a candidata pouco falou fora dos debates e comícios ensaiados. Não se sabe muito de sua vida nos EUA, onde estudou e se casou, ou o que de fato pensa para o Peru.
A pergunta está por ser respondida nos próximos dias, ou anos.