Peru expele independentes e escolhe entre velhos conhecidos
A uma semana do segundo turno que definirá o próximo presidente do Peru, a disputa está acirrada. O que era considerado “empate técnico” até poucos dias atrás já virou uma pequena, porém considerável, vantagem para Keiko Fujimori _45% a 40%, segundo a pesquisa Ipsos divulgada neste domingo (29). Para a filha do ex-ditador, só falta ganhar novamente um debate, o último, previsto para ocorrer nesta noite, e tentar atravessar ilesa uma semana em que manifestações anti-fujimoristas devem ocorrer em Lima e em outras cidades do país. Para seu rival, Pedro Pablo Kuczynski, a esperança é fazer com que os peruanos se lembrem do terrível que foi a ditadura do pai de Keiko, Alberto (entre 1990 e 2000) _Congresso fechado, oposição e imprensa caladas, altos níveis de corrupção_ e que, com essa recordação presente, rejeitem uma nova gestão de um membro desse clã.
O fantasma que já paira sobre essa eleição, porém, é outro. E tem a ver com a qualidade da democracia e das instituições peruanas, colocadas em dúvida desde pouco antes do primeiro turno. Como bem disse o secretário-geral da OEA (Organização dos Estados Americanos), o uruguaio Luis Almagro, o que o Peru está levando adiante é uma eleição “semi-democrática”. Isso porque, pouco antes da primeira votação, o Jurado Nacional de Elecciones, órgão responsável pelo pleito, excluiu duas candidaturas independentes e de fora do sistema partidário tradicional que ameaçavam ganhar um lugar no segundo turno. O presidente Ollanta Humala repudiou a afirmação de Almagro, disse que o JNE não sofre pressões políticas, mas o mal-estar na sociedade peruana sobre um possível comprometimento do órgão permaneceu.
Por que? Tanto o empresário César Acuña como o economista Julio Guzmán, sem grandes padrinhos políticos, vinham fazendo campanhas exitosas e galgando postos nas pesquisas _Guzmán chegou a ultrapassar Keiko numa delas, quando foram pegos de surpresa pela invalidação de suas candidaturas, quando a corrida já estava próxima do fim. A Acuña acusou-se de ter prometido dinheiro durante um comício, coisa que a lei peruana de fato proíbe. O caso levantou imensa polêmica porque, dias depois, surgiu um vídeo de Keiko fazendo exatamente a mesma coisa, num evento com jovens. O JNE, porém, absolveu Keiko, mas expulsou Acuña da eleição.
Já o tecnocrata Guzmán, o candidato independente que vinha com mais chances, fazendo uma campanha bem assessorada, usando bastante as redes sociais e articulando uma base por fora dos partidos tradicionais, caiu logo depois. Desta vez, a acusação do tribunal eleitoral foi de que havia uma irregularidade na escolha interna de seu partido. Apesar de ter apresentado defesa, ter o apoio de seus partidários e de seu eleitorado, teve de ficar de fora do jogo.
O que ambos tinham em comum era não possuir um passado político vinculado às forças tradicionais que vêm governando o Peru nas últimas décadas. Apesar de ter caído em 2000 e de estar na cadeia, o ex-ditador Alberto Fujimori permanece como líder de uma força política com muito espaço no Congresso e bastante influência entre o empresariado. Analistas políticos consideram que o “fujimorismo duro”, ou seja, a base de apoio quase incondicional do eleitorado a essa corrente política é de cerca de 30% dos eleitores. Keiko parte dessa base para, com a habilidade política acumulada desde a última eleição e a assessoria que vem recebendo, consiga se eleger, sob a benção dos aliados do pai, que seguem a seu lado.
Por sua vez, PPK, apesar de tentar apresentar-se como uma renovação _algo um tanto complicado do alto de seus 77 anos_ já participou de um governo, o de Alejandro Toledo (2001-2006), como primeiro-ministro e ministro de Economia, e permanece na política desde então.
Keiko e PPK diferem em muitos aspectos. De um lado, está o populismo de direita, de outro, um democrata conservador, mas liberal em matéria econômica. O que têm em comum é estarem apoiados em plataformas políticas tradicionais que não vêm deixando que as novidades, necessárias para o Peru, apareçam no cenário. Ganhe um ou outro, é de se esperar que os peruanos exijam, ao menos, uma apuração sobre a independência do JNE e das outras instituições do Estado.