O corpo pendurado em plena Cidade do México
O governo mexicano e seus apoiadores na mídia e na comunidade internacional gostam de vender a ideia de que o México que vive uma guerra civil é apenas um problema que será resolvido naturalmente caso o México industrializado, moderno e próspero siga avançando. Apesar de realmente existirem essas duas realidades num mesmo território, não há garantia de que o progresso do México “capitalista” vá vencer o do México que vive encharcado de sangue. Pelo contrário, a possibilidade de a violência dos cartéis avançar sobre áreas ditas “civilizadas” é mais do que concreta.
Prova disso é que, nesta semana, os habitantes da exuberante e fervilhante Cidade do México acordaram com uma imagem inusitada e tenebrosa. Pendurado na ponte da Concórdia, em plena zona metropolitana, estava o corpo de um homem (entre 35 e 40 anos), encapuzado, mãos atadas às costas e dois furos de bala na cabeça. No chão, uma cartolina com uma mensagem. Tudo indica um crime de vingança e demarcação de território, típico dos cartéis.
A imagem provocou pavor, mas não por ser desconhecida. Desde que foi iniciada a guerra contra o narcotráfico, na gestão do conservador Felipe Calderón (2006-2012), até hoje, cerca de 80 mil pessoas morreram em consequência dos enfrentamentos. Muitos desses cadáveres apareceram nas fotos dos jornais pendurados, descabeçados, atirados em grupo em fossas comuns. Mas isso, pensavam os habitantes da Cidade do México, acontecia apenas nas áreas distantes em que o Estado não conseguia atuar com eficiência. Ali, no chamado DF (Distrito Federal), era como se as pessoas vivessem em uma bolha de prosperidade e modernidade, imunes à violência no resto do país.
Nunca um corpo nessas condições tinha aparecido assim, como se fosse uma provocação às autoridades e ao país.
Não é de hoje que o governo Enrique Peña Nieto deve uma resposta satisfatória ao drama da violência. Inaugurar plantas de automóveis que dão inveja a Donald Trump nas regiões industrializadas do centro do país não apaga a tragédia dos 43 estudantes de Ayotzinapa. Investir em projetos de reforma e modernização energéticas não justifica a morte brutal de tantos jornalistas nos últimos dez anos, só para ficar nos exemplos mais conhecidos. O atual presidente paga agora pelo fato de não ter tido coragem de trazer, nem em sua campanha eleitoral e nem nos primeiros anos de governo, o tema da legalização das drogas para ser debatido com a sociedade e nem um plano específico para combater o crime organizado enraizado na estrutura da política regional.
Às vésperas de chegar ao meio de seu mandato, em dezembro, EPN tem sua popularidade no pior nível (35%, segundo a pesquisa Buendia & Laredo divulgada neste mês) desde que assumiu o poder. Arrisca-se, ainda, a ver novamente as ruas das grandes cidades se encherem de gente manifestando-se por tantos mortos e desaparecidos.
A imagem do homem morto pendurado de uma ponte em sua maior e mais próspera cidade não parece ser um cartão de visitas atraente para levar a reuniões com presidentes de grandes economias nem aos possíveis novos investidores estrangeiros interessados nos grandes recursos do país.