Com jovem liderança, direita mexicana tenta novo voo

Sylvia Colombo
Ricardo Anaya, o novo líder do PAN (Foto El Universal)
Ricardo Anaya, o novo líder do PAN (Foto El Universal)

Da primeira vez em que vi Ricardo Anaya, 36, discursando, em fevereiro de 2014, achei-o habilidoso e valente. Eu estava em Querétaro, tentando entrevistar Enrique Peña Nieto, e a cerimônia de aniversário da promulgação da constituição de 1917 era uma rara ocasião. Enquanto esperava o fim do evento para enfim encontrar o presidente mexicano, fiquei ouvindo os longos e repetitivos discursos das principais lideranças do país no auditório do histórico Teatro de la República. Quando Anaya subiu ao púlpito, já destoava pela juventude com relação ao resto dos convivas. Depois, impressionou pelo modo como articulou um discurso duro contra a esquerda e em apoio às reformas econômicas que Peña Nieto então levava adiante. Eram tempos do Pacto pelo México, e o partido da situação, o PRI (Partido Revolucionário Institucional), conseguira um momentâneo instante de paz com os outros partidos majoritários, o PAN (Partido da Ação Nacional, de direita) e o PRD (Partido da Revolução Democrática, de esquerda). O discurso um tanto dúbio de Anaya naquela manhã dava a impressão de que seu grupo não apoiaria incondicionalmente o presidente. E dito e feito. Em meses, o Pacto pelo México se desfez. Enquanto a esquerda se dividiu em duas frentes, o PAN viu todo o poderio construído na última década se diluir. Parecia que só haveria lugar apenas para o PRI, novamente, adiante do país.

Até aqui, isso parecia se confirmar. Mesmo enfraquecido pela desaceleração econômica e pelas críticas por conta da violência desenfreada no país, o PRI, que governou o México por 70 anos, ainda é a força majoritária a controlar o Congresso, os Estados e o país. Mas, no último fim-de-semana, o PAN começou a dar sinais de reação. À frente dele, quem diria, o mesmo Anaya, que de líder da Câmara dos Deputados se transformou em presidente do partido, em eleição realizada entre seus militantes. O ambicioso e articulado político agora promete recolocar a agrupação na disputa pela Presidência. O tombo do qual o PAN tem de se levantar, porém, não é pequeno. Recapitulando, em 2000, o partido chegou ao poder com Vicente Fox, encerrando um larguíssimo período de sete décadas de hegemonia priista. Com jeitão de caubói, forte estilo personalista e muito conservador, o novo presidente se elegeu com um discurso pragmático, que pregava enxugar estruturas já corrompidas pela burocracia criada por conta do longo tempo nas mãos de um mesmo partido. Se do ponto de vista econômico foi bem sucedido, teve muitos problemas para aprovar suas reformas devido à falta de maioria no Congresso e uma constante disputa interna, além de conflitos regionais, como o de Chiapas, que conturbaram sua gestão. De todo modo, em 2006, Fox fez seu sucessor, numa controversa eleição. O candidato do PAN, Felipe Calderón, venceu o esquerdista Antonio Manoel López Obrador por uma reduzidíssima margem de votos, e desde então teve sua autoridade questionada. Para mostrar pulso forte, iniciou a chamada “guerra ao narcotráfico”, avançando militarmente e com muita violência sobre os cartéis. A opção bélica causou mais de 60 mil mortos, e aos poucos foi desmoralizando o partido, que tampouco conseguiu mostrar bons resultados econômicos depois da crise mundial de 2008.

Vicente Fox e Felipe Calderón, ex-presidentes mexicanos do PAN (Foto: Reforma)
Vicente Fox e Felipe Calderón, ex-presidentes mexicanos do PAN (Foto: Reforma)

Nas eleições de 2012, portanto, o PAN já chegava esquálido. Sua candidata, Josefina Vázquez Mota, ficou num distante terceiro lugar, e o partido desinflou nos Estados e no Congresso. Anaya chega com a difícil tarefa de fazer com que os mexicanos voltem a acreditar na sigla. Entre os obstáculos, está um grande escândalo de corrupção (pra variar), o dos “moches”, em que funcionários dos governos municipais negociavam apoio em troca de verbas federais. Mais pitoresco, o envolvimento de algumas suas lideranças em festas com supostas prostitutas, amplamente veiculadas pelas redes sociais. Ainda, uma série de comentários racistas e gafes preconceituosas emitidos por seus integrantes, um deles apontando até mesmo para o craque brasileiro Ronaldinho, que atuou recentemente no Querétaro.

Mas o fato é que Anaya tem espaço para atuar. Desde que os protestos contra o atual governo se iniciaram, não havia surgido lideranças de peso nem à esquerda nem à direita. Seu jeito de bom moço, habilidade nas redes sociais (divulga vídeos de interação com populares) e discurso duro contra os populismos, em defesa de valores conservadores tradicionais do partido e contra a corrupção têm feito dele um líder cada vez mais popular. Tem uma visão algo mais moderada do que os partidários do PAN quanto às drogas _não é a favor da legalização ampla, mas que sejam discutidas alternativas para encarar o problema como de saúde pública e não militarmente. Também não é favorável ao aborto, mas é contra que se criminalizem as mulheres _só há aborto irrestrito na Cidade do México, não em todo o país. Até aqui, Anaya ainda não se anunciou pré-candidato, e o partido ainda tem outras figuras fortes, como a mulher de Calderón, Margarita Zavala, que também insinua interesse em participar da próxima disputa.

No México, os mandatos são de seis anos, sem reeleição. O atual presidente vai até 2018. As eleições de meio de mandato já foram, mostrando o PRI um pouco mais desidratado. Com a eleição de Anaya para presidente do PAN, começa oficialmente a próxima corrida eleitoral mexicana.