“A atual política contra as drogas representa um fracasso para a humanidade”, diz Diego Osorno

Sylvia Colombo
O escritor e jornalista DIego Enrique Osorno (Foto Divulgação)
O escritor e jornalista DIego Enrique Osorno (Foto Divulgação)

Uma das mesas mais bacanas desta Flip foi justamente a que surgiu de um imprevisto, o cancelamento da participação do italiano Roberto Saviano, por razões de segurança. Para manter o assunto de seu livro mais recente (“ZeroZeroZero”, Companhia das Letras) na agenda, o festival chamou dois jornalistas que atuam na linha de frente do relato sobre a guerra do narcotráfico, no México.

Aqui, um papo que tive com Diego Enrique Osorno, 35, nascido em Monterrey, autor de títulos sobre os cartéis Zetas e Sinaloa, sobre a revolta de 2006 em Oaxaca e de uma biografia do empresário mexicano Carlos Slim, um dos homens mais ricos do mundo.

Folha – México e Brasil subestimam a importância do tema do narcotráfico?

Diego Enrique Osorno – No México já não se subestima tanto como antes. O custo foi alto. Foram necessários milhares de execuções, desaparições, deslocamentos e atos de tortura para que fosse possível adquirirmos uma trágica consciência do que significa esse problema. O que é necessário mudar agora é o enfoque de atenção a essa realidade, creio.

O narcotráfico não pode mais ser visto como um problema meramente criminológico. Temos que analisa-lo politica e economicamente, uma vez que aí estão as chaves da questão, o problema de fundo. E isso não se aplica apenas a meu país, mas também a Honduras, Brasil e outros. A atual política contra as drogas representa um fracasso para a humanidade, mas um êxito para uma pequena rede de políticos e empresários sem escrúpulos.

Capa da revista "Gatopardo", com o perfil de Carlos Slim, por Osorno
Capa da revista “Gatopardo”, com o perfil de Carlos Slim, por Osorno

Folha – Ao mesmo tempo em que a situação, principalmente no México, vai ficando tão grave, têm surgido muitos títulos no mercado editorial sobre o assunto, uma nova geração de escritores e jornalistas jovens têm construído praticamente um sub-gênero de investigação e narrativa jornalística dedicado a isso. Como os vê, comparando com a cobertura que fazem os tradicionais meios mexicanos?

Osorno – A crise de violência que surgiu especificamente no México coincidiu com uma crise existencial que vivem os grandes meios de comunicação, não apenas no México, mas em quase todo o mundo, devido a aparição de novas modalidades de comunicação como as redes sociais. O modelo comunicativo está mudando, e as grandes empresas mexicanas de meios estão em processo de adaptação para sobreviver. Portanto creio que reagiram de modo lento e com pouca imaginação diante da grave crise de violência que vive o país. A parte positiva, como você apontou, é o surgimento de enorme manada de jornalistas independentes que estão colocando a cara e o esforço para documentar as consequências da chamada guerra ao narcotráfico.

 Folha – Estive em Guerrero há três meses, entrevistando parentes dos 43 estudantes desaparecidos e grupos de “autodefensas”. Você acredita que as províncias do Sul, como Guerrero e Oaxaca, portanto mais pobres, vivem uma situação mais difícil que as do Norte neste momento. Por que?
Osorno – Devido a sua proximidade com os Estados Unidos, os Estados do Norte do México têm padecido mais e desde há mais tempo a violência derivada da chamada guerra contra o narcotráfico. O que ocorreu nos últimos anos, porém, é que a fronteira dos EUA com o México como que se estendeu até o Sul e por isso houve aumento de atrocidades em lugares como Guerrero.
É um assunto interessante porque não apenas a violência do Norte do México desceu para o Sul, como também questões culturais relacionados ao contexto do Norte também migraram, como a música das bandas de Sinaloa, a gastronomia e outras áreas.
Folha – Em que está trabalhando neste momento?
Osorno – Atualmente estou investigando crimes contra a humanidade cometidos em Oaxaca em uma revolta ocorrida em 2006, ano em que teve início essa terrível crise de direitos humanos de que sofre o México e que ficou conhecida por uma parte do mundo apenas no ano passado, depois da desaparição dos 43 estudantes de Ayotzinapa.
Também está para ser publicada, pela Penguim Random House, em alguns meses, um longo retrato político que escrevi sobre Carlos Slim Helú, o mexicano mais rico do mundo.