Adeus, Vicente Aranda
Com um pouco de atraso, este blog não poderia deixar de registrar uma homenagem a Vicente Aranda, um dos principais cineastas espanhóis do século 20, morto aos 88, em Madri, na última quarta-feira (26), e importante influência dos cineastas latino-americanos. As contribuições do realizador são muitas, entre elas está a de ter revelado para o cinema, ainda na tenra idade, atrizes espetaculares que se projetariam para além das fronteiras espanholas, como Victoria Abril (com quem rodou 12 películas, quase metade de sua filmografia), Paz Vega, Loles León e Maribel Verdú.
Por aqui, seus filmes ficaram mais restritos a mostras e festivais. Os brasileiros, em geral, costumam identificar o cinema espanhol quase que somente com a figura de Pedro Almodóvar. Sem diminuir a importância deste último, é preciso dizer que Aranda já havia feito primeiro muito do que celebraria depois o diretor de “Mulheres À Beira de um Ataque de Nervos” (1988).
Em seus filmes, Aranda combinava erotismo, terror, um romantismo fatalista e um quê de humor negro, que podem ser vistos desde “Cambio de Sexo” (1976) até “Luna Caliente” (2009), a última produção que finalizou e apresentou _ficaria doente logo depois. Sua ousadia ao tratar de sexo e obsessões lembra um tempo em que o cinema se arriscava mais, diferentemente dos dias de hoje em que apenas se acomoda fazendo remakes, adaptando HQs e obedecendo cartilhas politicamente corretas.
A literatura era uma importante fonte de referências para Aranda _adaptou três livros do espanhol Juan Marsé e um do argentino Mempo Giardinelli. Em 2005, experimentou levar às telas um texto do século 15, “Tirante el Blanco”, clássico romance de cavalaria, com relativo êxito.
Aranda tinha uma fixação pelo período pós-Segunda Guerra na Espanha, período que o marcou muitíssimo. Sua família havia migrado para a Venezuela quando ele era pequeno, e em Caracas viveria até o início dos anos 60. De volta, começou a fazer filmes quando a Espanha começava a atravessar o período de transição, a morte do general Franco (1975) e a abertura. Aranda ficou conhecido como um dos principais nomes da Escola de Barcelona, grupo de jovens cineastas que, nos anos 70, oferecia uma visão crítica e uma reflexão sobre aquele agitado momento de uma recém-renascida democracia.
Seu principal filme, porém, é uma história de amor e de crime, contada em tom de suspense erótico. “Los Amantes”, de 1991, tinha como estrelas os jovens Jorge Sanz, Maribel Verdú e Victoria Abril. Baseada numa tragédia real, ocorrida nos anos 50, a trama de “Amantes” entrelaça as obsessões do sexo e do ciúme com o contexto político e social da Espanha daquela época, seus moralismos e desesperanças. Para quem não se preocupa com “spoilers”, a cena final está aí acima.