Sendero Luminoso, de novo em pauta

Sylvia Colombo

Uma das bandeiras que os fujimoristas levantam até hoje, para defender a ditadura que dominou o Peru por nada menos que dez anos (1990-2000) é a de ter acabado com a guerrilha terrorista Sendero Luminoso. O fato de que o grupo continuava atuando no interior do país, e ganhado um braço político cada vez mais ativo, era uma verdade dura de ser admitida pelos peruanos. Nos últimos tempos, porém, tornou-se impossível esconder a verdade, e as notícias sobre as movimentações da guerrilha vão ganhando mais espaço na mídia. Foi por isso que, ontem, a divulgação da prisão de mais de 20 pessoas acusadas de vínculos com o Sendero e o surgimento de evidências de que dinheiro do narcotráfico é usado na campanha política de ex-terroristas, não espantou ninguém.

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Aqui na serra peruana, onde vim fazer uma reportagem, colhi alguns depoimentos de gente que passava diante da banca de jornais e lia por alto as dezenas de manchetes de jornais populares sobre as prisões. “Eles estão aí, sempre estiveram, a questão é que agora são bandidos, nada mais, sem ideologia”, diz Tristán Gomez, estudante de computação. “Os fujimoristas usaram o povo do interior para se manter no poder, usaram a ignorância daqueles que se sentiam mais protegidos durante a ditadura. Era tudo farsa, porque o problema continua”, diz Isabel Robles, professora de ensino médio. Já um senhor que não quis se identificar, discordou da professora: “Com Fujimori estávamos bem. Esses criminosos já estariam presos.”Coincidentemente, acabo de chegar por aqui vinda de Lima, onde comprei a nova edição da excelente investigação “Sendero – História de la Guerra Milenaria en Peru”, do jornalista Gustavo Gorriti. Escrito no calor dos acontecimentos, foi publicado em 1990, quando a guerra contra o grupo se acirrava. Trouxe documentos, relatos e depoimentos que deram cor a essa guerra que produziu nada menos que 70 mil mortos, muitos deles civis inocentes, da população pobre e carente das serras peruanas. Outro livro essencial para mergulhar no assunto é “La Cuarta Espada”, de Santiago Roncagliolo. Ele mesmo uma vítima da intensa história política do Peru _passou a infância no México, durante a ditadura militar em seu país nos anos 70_ Roncagliolo estudou o contexto que criou o líder senderista Abimael Guzman, hoje preso em Callao, em Lima. Roncagliolo expõe o clima de fanatismo e de radicalismo ideológico que se espalhava pelo interior e que gerou diversos grupos guerrilheiros extremamente dogmáticos. O Sendero foi o mais importante entre eles, mas longe de ser o único. Voltando a seu livro agora, é possível entender porque é tão difícil simplesmente extingui-los, uma vez que tantas condições e crenças e tradições culturais que o formaram seguem vivas.
Abaixo, as impressionantes cenas de Abimael Guzmán enjaulado, tiradas do documentário “The Fall of Fujimori”. É curioso ver o discurso do terrorista na época, dizendo que o “sonho não havia terminado” e que o Sendero não estava morto. Fujimori, vitorioso, dizia que tinha colocado um uniforme de prisioneiro com listras no terrorista só porque “era assim que apareciam os presos nos filmes”. A ironia é que hoje Fujimori também está preso, a não muitos quilômetros do terrorista. Da cadeia, Fujimori faz campanha pela filha, Keiko. Também da cadeia, Guzmán segue lembrando que sua guerra não está morta. Algo que o atual e os próximos governantes do Peru terão de aprender é que não é simples terminar com uma guerra. Colocar os protagonistas na cadeia não basta.