“Newen Mapuche”, o Chile esquecido

Sylvia Colombo

Na semana passada, fiz um post sobre o Chile, celebrando o bom momento econômico e o clima de renovação política que circunda a nova posse de Michelle Bachelet, na próxima terça-feira. Há que se lembrar, porém, que os números favoráveis de crescimento do PIB, as torres modernas que se erguem à beira do rio Mapocho, na capital, Santiago, e os avanços nos direitos humanos, com vários casos da ditadura (1973-1990) finalmente sendo investigados, não representam toda a realidade.

Há uma parte do Chile que sangra e pede justiça. Trata-se da nação mapuche e de outras tribos indígenas do sul do país, que sofreram forte repressão do governo conservador de Sebastian Piñera. Diante de protestos dos nativos, o presidente chegou a defender o uso da lei antiterrorismo e autorizou atuação ferrenha da polícia e do Exército para conter os distúrbios. O documentário “Newen Mapuche”, de Elena Varela, retrata bem esse conflito.

Os mapuches (ou araucanos) compõem um dos principais grupos indígenas da América do Sul. No século 16, resistiram ferrenhamente à ocupação espanhola e desde então defendem autonomia para a zona que ocupam, que corresponde ao centro-sul do Chile e o Sudeste argentino. Hoje, tem uma população de cerca de 1 milhão de pessoas.

O leque de reivindicações dos mapuches é amplo, vai da demarcação de áreas de proteção ambiental, cotas universitárias, planos de assistência, leis anti-racismo, fim da presença ostensiva da polícia, justiça para a morte de ativistas, como os jovens Alex Lemún e Matías Catrileo. O Estado alega que tem promovido políticas em seu benefício, como programas de ensino da língua mapudungun nas escolas, erguimento de estátuas para heróis históricos mapuches e celebração de feriados. Os ativistas dizem que isso é pouco. O fato é que a Araucania, região em que vivem, tem uma taxa de pobreza de 23%, a mais alta num país cuja média é 15%.

O drama mapuche, que se revela em confrontos, incêndio de florestas e tensão social nas cidades do Sul, revela um Chile ainda imperfeito, onde os bons números da economia não se traduzem em melhora da vida dos chilenos, indígenas ou não. Que a nova página da história do país, que começa na terça, não se esqueça deles.