Caderninhos de Saer

Sylvia Colombo

Aos 28 anos, o escritor argentino Juan José Saer escreveu:

“Não permitirei que ninguém penetre nos meus cadernos, como fizeram com Kafka ou com Pavese. Não morrerei. Eu escolherei com o tempo qual é a palavra justa e necessária que devo dizer, e o resto jogarei no fogo. Sei que tenho madeira de escritor dos grandes e meu dever consiste em não permitir que celebrem como verdades os meus equívocos, ou como genialidade as minhas torpezas.”

Mas o autor de “Unidad de Lugar” (1967) e “El Limonero Real” (1974), natural de Santa Fe, mas radicado em Paris por mais de trinta anos, não queimou seus escritos. Ao contrário, os levou consigo através de mudanças até sua morte, em Paris, em 2005. “Papeles de Trabajo – Borradores Inéditos”, que sai agora na Argentina, é uma coletânea de manuscritos, anotações, rascunhos, aforismos e comentários de leituras de Saer sobre seus livros e roteiros de cinema.

O escritor interiorano foi um dos grandes autores contemporâneos argentinos, ao lado de Tomás Eloy Martínez (1934-2010) e Ricardo Piglia. A ensaísta e crítica literária Beatriz Sarlo já declarou que considera “Ninguém, Nada, Nunca” (Companhia das Letras) um dos melhores retratos da Argentina durante a ditadura, uma trama que envolve o assassinato misterioso de cavalos na província.

Entre seus principais livros, também saíram no Brasil “As Nuvens” (Companhia das Letras) e “O Enteado” (Iluminuras). Este é um relato fictício baseado num episódio real, o abandono de um grumete espanhol que pertencia à expedição de Juan Díaz de Solís entre índios canibais numa ilha do Rio da Prata, no século 16. O garoto, único sobrevivente de um ataque transformado em banquete humano, vive e cresce no meio dos “selvagens”, e depois tem de enfrentar a “civilização” em sua volta à Europa.

Em “Borradores Inéditos” há comentários sobre Faulkner, Baudelaire, Fourier, Borges, Evita, glossários de palavras para serem usadas em textos e, curiosamente, relatos de sonhos e desabafos contra sua própria distração e dispersão. Não há nenhum livro inédito, mas é um convite para aproximar-se do entorno de suas novelas. Refletem o escritor de ideias e imagens fortes, mas de comportamento dócil e amável. Mais ou menos como se vê nesta entrevista, em que o tom cordial não minimiza as duras críticas a, entre outras coisas, Michel Houellebecq, García Márquez e o jornalismo cultural.

 

Comentários

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