O “histeriqueo”, ou a guerra dos sexos na Argentina

Sylvia Colombo

“Pare, meu amor, tenho que te dizer algo. Vou fazer ‘las lolas’ (cirurgia para aumentar o peito).”

O homem disfarça, por dentro está explodindo de emoção, mas faz cara de quem lamenta e responde: “bom, se você quer…”

A nova publicidade da Fiat local parece banal, mas contém a chave para entender o jogo da sedução na Argentina. Talvez seja o país onde a ideia de que a indiferença e a rejeição são os principais motores do sentimento amoroso chega a níveis incalculáveis, quase patológicos. Não é preciso estar aqui há muito tempo para familiarizar-se com o verbo “histeriquear”.

Segundo o Houaiss, “histeria” é uma “doença nervosa que, supostamente, se originava no útero, caracterizada por convulsões”, ou ainda “comportamento caracterizado por excessiva emotividade ou por um terror pânico”. Ainda, segundo a Real Academia Espanhola,  trata-se de uma “doença nervosa, crônica, mais frequente na mulher do que no homem, caracterizada por uma grande variedade de sintomas, principalmente funcionais, e às vezes por ataques convulsivos.”

Pois bem, na Argentina não é nada disso. Uma mulher ou um homem “histéricos” são aqueles que demonstram interesse pelo outro, mas depois pulam fora, muitas vezes só para mostrar que, no fundo, estão interessadíssimos. Depois. Bem depois. Os processos podem ser longuíssimos, alguns nunca acabam e atravessam casamentos de vida inteira. A esse intrigante fenômeno, de muitas idas e vindas, se dá o nome de “histeriqueo”, que aqui virou verbo e é usado cotidianamente.

Nos últimos tempos, andei perguntando sobre o “histeriqueo” a alguns conhecidos. Um vendedor de jornais da minha rua conta que “perseguiu” sua atual mulher com cartas, convites e mensagens por quase dois anos. “Puxa. E não se cansou?”. “Nada, fui ficando cada vez mais apaixonado. Nunca sofri tanto na vida”, diz, com certo orgulho. Quando ela enfim aceitou sair com ele, pensou que deveria “valorizar”, e não só disse “não” como desapareceu do mapa e não cogitava voltar. Só nove meses depois, quando se reencontraram por acidente na rua, tomaram um café e começaram a sair.

Também um amigo brasileiro, por aqui temporariamente, quase enlouqueceu com uma argentina que aceitava todos os seus convites. Iam ao cinema, jantavam, até uma pequena viagem à província fizeram. Mas, na hora do sexo, ela sempre pulava fora. A rejeição constante, no caso dele, o enraiveceu. “Se eu fosse um argentino, talvez me apaixonasse”, resume.

Pergunto a um psicanalista se ele acha que esse comportamento não reflete uma sofisticação nos costumes que, de repente, nós, brasileiros, não temos. “É uma forma simpática de ver o tema. Talvez seja verdade. Tem a ver com o modo dramático e complicado com que nós vemos a vida. Nada é simples e fácil para os argentinos. Tudo é sofrido e complexo. Um processo de conquista não seria diferente.”

Mas, como saber qual é a hora da sinceridade? Ou nunca se diz a verdade? O escritor Martín Kohan tentou me explicar isso outro dia, de forma didática. “É preciso atravessar algumas etapas. Depois do ‘sim’-que-quer-dizer-‘não’ vem o ‘sim’-que-quer-dizer-‘não’-mas-que-na-verdade-é-‘sim’…” Só que ele mesmo alerta que, dependendo do casal, a mesma operação pode ser duplicada infinitamente.

Sendo assim, concluo que o casal da publicidade está na fase 1 da relação. Ou não é nada disso e deixo a solução do enigma para a próxima visita a Buenos Aires do querido blogueiro dos corações e rei do portunhol Xico Sá.

Comentários

  1. Hey there! This is my first comment here so I just wanted to give a quick shout out and tell you I genuinely enjoy reading your articles. Can you suggest any other blogs/websites/forums that deal with the same topics? Appreciate it!

  2. Pingback: dialysis lawsuit
  3. I am not sure where you’re getting your information, but great topic. I needs to spend some time learning more or understanding more. Thanks for great info I was looking for this info for my mission.

  4. Can I simply say what a relief to uncover someone that actually knows what they are talking about on the net. You definitely understand how to bring an issue to light and make it important. More people need to read this and understand this side of your story. I was surprised you are not more popular since you definitely possess the gift.

  5. Pingback: mathtutordvd
  6. I blog often and I genuinely appreciate your content. The article has truly peaked my interest. I will bookmark your blog and keep checking for new details about once per week. I opted in for your Feed as well.

  7. Hello there, I think your web site could possibly be having browser compatibility issues. When I look at your site in Safari, it looks fine however when opening in I.E., it has some overlapping issues. I simply wanted to provide you with a quick heads up! Besides that, excellent website!

  8. Pingback: basic algebra dvds
  9. Pingback: read
  10. Pingback: Luxury Spa NYC
  11. I’ve learned a number of important things as a result of your post. I would also like to mention that there may be situation in which you will obtain a loan and never need a co-signer such as a U.S. Student Aid Loan. However, if you are getting credit through a standard loan company then you need to be able to have a co-signer ready to make it easier for you. The lenders will certainly base their decision over a few aspects but the greatest will be your credit ratings. There are some creditors that will as well look at your work history and decide based on that but in almost all cases it will be based on on your report.

  12. I believe that avoiding prepared foods would be the first step for you to lose weight. They could taste good, but processed foods have very little nutritional value, making you eat more in order to have enough strength to get with the day. In case you are constantly feeding on these foods, converting to whole grains and other complex carbohydrates will assist you to have more strength while having less. Interesting blog post.

  13. Green coffee may be the results of brewing unroasted pinto and black beans or what exactly is otherwise known as coffee fruit. As we all know, the bitterness within the coffee we enjoy today is the product of brewing dark coffee bean. To begin with they become such as this they should be roasted properly. In 1100AD, the manner of roasting hasn’t been yet practiced so people brewed green coffee beans to create a tea-like beverage. The product of brewing green coffee beans is still used to make some sorts of Arabic coffee today.

  14. Pingback: ca do bong da
  15. Its my good luck to go to see at this blog O “histeriqueo”, ou a guerra dos sexos na Argentina | Sylvia Colombo – Folha de S.Paulo – Blogs and find out my required post along with video presentation, that YouTube video and its also in quality.

Comments are closed.